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Novas facetas na terapia de reposição androgênica durante a infância e adolescência
Luiz Luna Barbosa, Bruno Leslie, Sérgio Ottoni, Márnio Solermann S. Costa, Pedro Vanalle Ferrari, Antônio Macedo Júnior, Valdemar Ortiz
Disciplina de Urologia da Escola Paulista de Medicina-Unifesp-EPM.


Numeração de páginas na revista impressa: 73 à 76

Introdução


Puberdade é definida como o período de transição entre a infância e a fase adulta, em que ocorre o desenvolvimento das características sexuais secundárias, a aquisição de capacidade reprodutiva e da estatura final(1). Ela começa com o aumento da secreção pulsátil do hormônio liberador de gonadotrofina (GnRH)(5).

A idade em que a puberdade é iniciada é variável, sendo influenciados pelo sexo, fatores genéticos, ambientais e metabólicos. Em meninos, o primeiro sinal do desenvolvimento da puberdade é um aumento no volume testicular (> 4 ml), que ocorre na idade média de 12 anos. Em termos práticos, a puberdade é considerada retardada quando o volume testicular é menor que 4 ml em meninos com idade cronológica de 14 anos.

O retardo puberal resulta da secreção inadequada dos esteróides gonadais e, freqüentemente, é de origem constitucional. No entanto, pode ser causado por uma variedade de patologias hipotalâmicas, hipofisárias e gonadais ou, ainda, ser secundário a várias doenças sistêmicas de origem endócrina ou não(6).

O retardo puberal está associado com distúrbios psicossociais severos, que podem ser decorrentes da baixa velocidade de crescimento, da ausência dos caracteres sexuais secundários, das modificações na imagem corporal e redução da densidade óssea final. O início e o tipo do tratamento deve ser individualizado, dependendo da etiopatogenia e das repercussões clínicas e psicossociais.

Retardo constitucional do crescimento e da puberdade (CDGP)

O quadro clínico da CDGP é caracterizado por baixa estatura em comparação com a altura familiar, resultando em uma diminuição de crescimento entre 2 e 4 anos de idade, associado a um atraso no desenvolvimento puberal e maturação óssea de cerca de 2 anos. É a causa mais freqüente de puberdade retardada, sendo considerada por alguns autores uma variante normal do desenvolvimento puberal, visto que a maioria desses pacientes acaba atingindo a estatura esperada para o seu padrão familiar(1).



Em decorrência das repercussões negativas do ponto de vista psicossocial, como depressão, comportamento agressivo, baixa auto-estima, mau desenvolvimento escolar, reclusão social, e também pelo prejuízo na estatura média esperada para a sua família, alguns autores preferem encarar a CDGP como uma entidade clínica que necessita de tratamento, o que justificaria uma atitude mais intervencionista(2) (Quadro 1).

A Tabela 1 demonstra o tratamento hormonal para CDGP em meninos.


*IO – idade óssea; IC – idade cronológica.

Há um consenso de que a administração cíclica da testosterona é freqüentemente seguida de uma rápida e espontânea progressão da puberdade, embora esse mecanismo não esteja bem esclarecido(1). A maioria dos autores advogam que a reposição de testosterona não deva ser iniciada até que o paciente possua uma idade óssea mínima de 12 anos ou cronológica de 14 anos, já que Resumidamente, o tratamento da CDGP consiste em explicar para o paciente e seus familiares que o início da puberdade pode instalar-se em um intervalo de tempo bastante variável, sendo possível um desenvolvimento e crescimento normal, embora atrasado. Apenas casos com retardo severo em que importante repercussão psicossocial se instala, a reposição hormonal deve ser indicada.


* IO – idade óssea; IC – idade cronológica.

Hipogonadismo

Pode ser decorrente de uma falência gonadal primária (hipergonadotrófico) ou secundário a alterações hipotalâmico-hipofisárias (hipogonadotrófico) congênitas ou adquiridas. A forma de apresentação varia desde a ausência da instalação da puberdade ou desenvolvimento incompleto da mesma(2). Nessas situações é necessário induzir e/ou completar o desenvolvimento dos caracteres sexuais secundários.

Uma vez que o desenvolvimento puberal é alcançado, um regime de reposição crônica de esteróides sexuais deve ser mantido, garantindo assim a função sexual, a manutenção das características sexuais secundárias e as diversas funções metabólicas que requerem a presença dos esteróides sexuais. A indução da puberdade deve mimetizar a velocidade da mesma, a fim de não comprometer a estatura final do paciente.

Em situações em que a altura final está comprometida, como na deficiência do hormônio de crescimento e na Sd. de Turner, pode ser permitido o retardo puberal, na tentativa de aumentar a estatura do paciente na idade adulta. A terapia, portanto, deve ser individualizada, levando-se em consideração as características do paciente.

No caso de falência gonadal primária (hipogonadismo hipergonadotrófico), na qual a capacidade de produção de testosterona está ausente, a terapia androgênica deve ser substitutiva. Se a falha estiver no estímulo gonadal (hipogonadismo hipogonadotrófico), outras alternativas terapêuticas estarão disponíveis, como o uso de gonadotrofinas.

Para o tratamento de manutenção, várias formas de administração estão disponíveis: oral, intramuscular, transdérmica (patches ou gel) e implantes subcutâneos(3).
Quando administrada oralmente, a testosterona livre é quase totalmente inativada pelo fígado. O único esteróide sexual recomendado para administração oral é o undecanoato de testosterona, que é formulado em cápsula, em suspensão com o ácido oléico, que favorece a absorção da testosterona pelos quilomícrons, sendo carreados para o sistema linfático, prevenindo a degradação inicial pelo fígado. Os níveis séricos de testosterona flutuam bastante com a via oral, sendo às vezes necessárias múltiplas doses diárias.

A administração transdérmica e os implantes subcutâneos não são boas alternativas durante a fase de indução de puberdade em meninos. Os níveis de testosterona são variáveis e inadequados para pacientes ainda em fase de crescimento(4).

A administração intramuscular é, portanto, a melhor rota para a indução da puberdade, pois a forma injetável é a única que permite adaptação para o aumento da quantidade de andrógeno para os diferentes estágios do desenvolvimento puberal(3). O pico de testosterona é atingido em 24 horas, com duração de aproximadamente duas semanas. A menor dose possível deve ser utilizada, para conservar o potencial máximo de crescimento(1). A dose é aumentada a cada 6-12 meses, sendo que em um período de 3 a 5 anos, esses pacientes já passam a receber a dose substitutiva de um adulto, que varia entre 200 e 250 mg, a cada 10 a 14 dias, conforme demonstrado em Tabela 2.

Uma desvantagem da terapia com ésteres de testosterona é que o volume testicular não aumenta. Em meninos com hipogonadismo hipogonadotrófico, onde o aumento testicular é desejado, o uso das gonadotrofinas ou do hormônio liberador da gonadotrofina (GnRH) é uma alternativa.

As gonadotrofinas podem ser administradas por via intramuscular ou subcutânea. Pode-se iniciar com hCG na dose de 500-1500 UI em dias alternados ou em combinação com FSH, com este na dose de 75-100 UI em dias alternados. Se apenas o hCG for usado, após 6-12 meses de tratamento ou quando um platô no volume testicular é atingido, dever-se-á acrescentar o FSH na dosagem citada anteriormente por 12-24 meses. Esse tratamento, na maioria das vezes, é capaz de induzir o desenvolvimento puberal, aumentar o volume testicular e estimular a espermatogênese. Dentro os efeitos colaterais das gonadotrofinas, o principal é a ginecomastia. Outros efeitos menos freqüentes são: reações locais no sítio de injeção (eritema e enduração) e produção de anticorpos anti-hCG(1).

Em pacientes com disfunções hipotalâmicas, a administração pulsátil de GnRH é uma alternativa terapêutica, uma vez que a capacidade de secreção hipofisária de gonadotrofina está intacta. Pode ser feito através de dispositivos portáteis programáveis, seja intramuscular ou subcutâneo, nos quais pulsos de GnRH são administrados a cada duas horas. A dose inicial é de 5-25 ng/kg por pulso, sendo a dose progressivamente aumentada em função dos níveis de testosterona, FSH e LH.

Conclusão

Várias patologias podem estar associadas com atraso da maturação sexual e diminuição da secreção de esteróides gonadais. O tratamento do atraso puberal deve ser individualizado de acordo com a condição etiológica e idade do paciente. A terapêutica hormonal é ampla, sendo mais comumente utilizada a forma de administração intramuscular de ésteres de testosterona como o Durateston®, combinação de quatro ésteres de testosterona e Deposteron® (cipionato de testosterona), tendo como alternativas a forma de administração em gel e adesivos escrotais e não escrotais.




Bibliografia
1. Pozo j, Argente J. Ascertainment and Treatment of Delayed Puberty. Hormone Research 2003; 60 (suppl 3):35-48.
2. Rogol AD. New Facets of Androgen Replacement Therapy During Childhood and Adolescence. Expert Opin Pharmacother; Jul; 6(8): 1319-36.
3. Basaria S, Dobs AS. New Modalities of Transdermal Testosterone Replacement. Treat Endocrinol. 2003;2(1):1-9.
4. Rogol AD. Pubertal Androgen Therapy in Boys. Pediatr Endocrinol Rev. 2005 Mar; 2(3):383-90.
5. MacGillivray MH. Induction of Puberty in Hypogonadal Children. J Pediatr Endocrinol Metab. 2004 Sep: 17 Suppl 4:1277-87.
6. Vilar Lúcio. Endocrinologia Clínica. 3ed-Rio de Janeiro-Guanabara Koogan, 2006:189-203.
7. P. Reed Larsen et al. Williams Textbook of Endocrinology 2002 -10th ed. Saunders: 1170-1202.