Marcadores tumorais bioquímicos |
Maria Lúcia C. Gomes Ferraz |
Prof. adjunto da Disciplina de Gastroenterologia do Departamento de Medicina da Escola Paulista de Medicina – UNIFESP Assessora Médica de Bioquímica Clínica do Laboratório Fleury |
Adagmar Andriolo |
Prof. livre-docente de Medicina Laboratorial do Departamento de Medicina da Escola Paulista de Medicina – UNIFESP Assessor Médico de Bioquímica Clínica do Laboratório Fleury |
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Introdução Previsões realistas indicam que, apesar dos grandes progressos obtidos nas áreas de pesquisa e tratamento, o câncer será uma das mais importantes causas de morte no próximo século. A mortalidade, nesta patologia, varia na dependência do tipo de câncer considerado, observando-se significativa redução, por exemplo, na doença de Hodgkin e nos cânceres do colo do útero e do estômago, enquanto que outros, tais como câncer de pulmão, melanoma e mieloma múltiplo, têm apresentado elevação significativa. A prevenção e a detecção precoce, aliadas a tratamentos cada vez mais efetivos, são os recursos mais poderosos para a redução tanto da morbilidade quanto da mortalidade decorrentes dos processos neoplásicos em geral. Quando um câncer é diagnosticado em estádio precoce é, potencialmente, curável por procedimentos cirúrgicos, os quais têm por objetivo a remoção completa da massa tumoral. Muitos processos neoplásicos, porém, não produzem manifestações clínicas evidentes nas fases iniciais ou antes que algumas de suas células tenham se deslocado para outros tecidos, caracterizando o fenômeno da metastatização. A probabilidade de existência de metástases no momento em que aparecem os primeiros sinais e/ou sintomas varia com o tipo e localização do câncer, sendo, por exemplo, da ordem de 30% para o câncer uterino e de quase 100% para o câncer pancreático. Avanços nos conhecimentos de biologia molecular têm proporcionado melhor entendimento dos mecanismos fundamentais que regulam a proliferação e a diferenciação celulares, bem como o desenvolvimento de metástases tumorais. A proliferação celular normal ocorre de forma controlada pela atuação conjunta de fatores promotores, os oncogens, e de fatores restritivos, denominados genes supressores. O aparecimento do câncer parece ser decorrente ou da excessiva ativação ou da alteração de expressão dos oncogens, da perda de função dos supressores ou de ambos os mecanismos, simultaneamente(1). |
Marcador tumoral O marcador tumoral perfeito deveria ser altamente específico para um determinado tipo de neoplasia e suficientemente sensível para detectar a presença de pequeno número de células neoplásicas, permitindo o diagnóstico precoce, mesmo em estudos populacionais. Ainda de uma forma ideal, o marcador deveria ser produzido apenas pelas células neoplásicas e ser facilmente detectado no sangue ou fluidos biológicos. A maioria dos marcadores tumorais disponíveis atualmente não preenche estas características, limitando processo neoplásico. Alguns, porém, possuem sensibilidade e especificidade suficientes para que possam ser utilizados no acompanhamento da evolução da doença no paciente previamente diagnosticado e submetido a algum tipo de tratamento, possibilitando o diagnóstico precoce da recorrência. Do ponto de vista analítico, sensibilidade é a menor quantidade da substância que pode ser corretamente detectável e, do ponto de vista epidemiológico, este termo se refere ao número de resultados falso-negativos que escapam ao diagnóstico, em decorrência de limitação da metodologia. Especificidade analítica, por sua vez, diz respeito à possibilidade de interferentes presentes na amostra prejudicarem a obtenção de resultados corretos, enquanto que especificidade epidemiológica está relacionada ao número de resultados falso positivos detectados. A avaliação dos valores preditivos, tanto positivos quanto negativos, dos ensaios de marcadores tumorais possui uma dificuldade adicional no que se refere ao correto dimensionamento da prevalência dos processos neoplásicos, uma vez que esta pode ser extremamente variável, na dependência da patologia específica, do sexo, da idade, do grupo étnico etc, considerados. Histórico O primeiro marcador tumoral descrito foi a proteína de Bence-Jones, em 1847, quando sua presença na urina passou a ser evidência diagnóstica do mieloma múltiplo(2). Passaram-se 100 anos antes que a natureza química exata desta proteína fosse esclarecida, através dos trabalhos de Porter e de Edelman e Poulik, pes-quisadores que ganharam o prêmio Nobel de Medicina por identificarem a proteína de Bence-Jones como sendo a cadeia leve de imunoglobulina (Kappa ou Lambda) livre, produzida pelos plasmócitos. Um resumo da história dos marcadores tumorais encontra-se na Tabela 1, como descrita por Sell. Esta história pode ser dividida em cinco fases distintas. A primeira tem início com a descrição da própria proteína de Bence-Jones, indo de 1846 a 1928. A segunda se caracterizou pela aplicação dos hormônios, enzimas, isoenzimas e outras proteínas como auxiliares para o diagnóstico de neoplasias. Esta fase compreende o período de 1928 a 1963. O início do terceiro período é marcado pelas descobertas da alfa-fetoproteína e do antígeno carcinoembriônico, em 1963 e 1965, respectivamente. Foi nesta fase, de 1963 a 1975, que se criou o termo marcadores oncofetais. O quarto período começou em 1975, com o desenvolvimento dos anti-corpos monoclonais e sua aplicação na detecção de antígenos específicos derivados de linhagens celulares neoplásicas. Esta é a era dos antígenos CA 125, CA 15-3, CA 549, entre outros. A partir de 1980, teve início o quinto período da história dos marcadores tumorais pelo uso associado de sondas moleculares e anticorpos monoclonais com a finalidade de detectar alterações cromossômicas, o que possibilitou o estudo dos onco-gens e dos genes supressores. Definição Marcador tumoral é uma substância presente no tecido tumoral, no sangue ou em outros fluidos biológicos, produzida primariamente por ele ou, secundariamente, pelo paciente, em resposta à presença do tumor. É importante que esta substância possa ser utilizada para diferenciar tecidos normais de neoplásicos e que possa ser caracterizada e/ou quantificada por procedimentos relativamente práticos. Poucos marcadores tumorais possuem especi-ficidade para um determinado tipo de tumor (marcador específico), sendo que a maioria deles pode ser detectada em diferentes tumores do mesmo tecido (marcadores associados). Antígenos tumor-específicos são aqueles presentes apenas em células neoplásicas e podem ser observados em tumores espontâneos ou induzidos por agentes químicos ou virais. Os mecanismos de aparecimento destes antígenos não estão perfeitamente entendidos. É possível que o carcinógeno promova a indução de oncogens dormentes. Antígenos tumor-associados são aqueles que estão presentes tanto em células neoplásicas quanto em células normais. Diferenciam-se ou pela quantidade ou pela forma com que se apresentam(3). Classificação Enzimas ou isoenzimas têm sido utilizadas como marcadores tumorais. Elevações significativas da atividade total ou variações no padrão habitual de distribuição das suas diferentes formas – isoenzimas – podem ser indicativas da presença de processo neoplásico. Deve ser ressaltada a baixa especificidade deste tipo de marcador. A Tabela 2 apresenta algumas enzimas e os órgãos nos quais os tumores estão mais frequentemente associados. A dosagem de alguns hormônios também pode ser utilizada para a detecção e monitorização de determinados tumores. O envolvimento dos hormônios como marcadores tumorais pode ocorrer de duas maneiras distintas: por produção aumentada pelo tecido endócrino normalmente produtor ou pela produção ectópica, por tecido normalmente não produtor de hormônios. Estas duas formas podem ser exemplificadas pelo hormônio adrenocorticotrófico (ACTH) presente tanto no de tumor da hipófise quanto no tumor de células pequenas do pulmão. A Tabela 3 apresenta alguns dos hormônios mais frequentemente utilizados como marcadores e os respectivos tipos de tumores a eles relacionados. Alguns marcadores tumorais são a expressão de substâncias normalmente presentes em tecidos embrionários mas ausentes no tecido adulto. São denominados de antígenos oncofetais e se constituem em proteínas presentes em altas concentrações no soro de fetos, declinando rapidamente e até desaparecendo logo após o nascimento. Nos pacientes com alguns tipos de câncer, estas proteínas reaparecem em circulação, demonstrando que certos genes foram reativados como decorrência da transformação neoplásica das células. Os marcadores oncofetais mais frequentemente utilizados são o antígeno carcinoembriônico e a alfa-fetoproteína. Determinados antígenos presentes na superfície da célula neoplásica, tais como CA 125, CA 15-3 e CA 19-9, podem ser utilizados como marcadores tumorais e, em geral, apresentam melhor sensibilidade e especificidade do que os antígenos oncofetais. Constituem-se em proteínas de elevado peso molecular e altamente carboidratadas. O Quadro 1 apresenta alguns dos marcadores tumorais bioquímicos utilizados antes do desenvol-vimento de metodologias mais específicas, como os ensaios com anticorpos monoclonais. Estes marcadores continuam tendo grande aplicação, ainda hoje, em casos específicos. O Quadro 2 relaciona os marcadores disponibilizados a partir da identificação de antígenos oncofetais e amplamente utilizados, já com a aprovação pelo FDA. O Quadro 3 apresenta os marcadores mais recentemente utilizados, para os quais as potenciais vantagens ainda se encontram em fase de validação. Marcadores genéticos passaram a ser consi-derados como possuindo grande potencial diagnóstico como indicadores de neoplasias. Dentre estes marcadores, destacam-se os oncogens, os genes supressores e os produtos protéicos dos oncogens. É sabido que podem ser necessárias várias alterações genéticas para que uma célula normal se transforme em neoplásica, dessa forma, a possibilidade de identificação destas alterações pode se tornar em instrumento para o estabelecimento precoce do risco de ocorrência de câncer. Atualmente, cerca de 40 oncogens estão identificados, dos quais muito poucos já podem ser utilizados como marcadores tumorais. Aplicações clínicas Os marcadores tumorais podem ser utilizados com diversas finalidades, das quais se destacam o estabele-cimento do prognóstico de pacientes portadores de neoplasias, a monitorização da eficiência da terapêutica e a detecção precoce de recorrência. Características espe-cíficas da população na qual será aplicado e do próprio marcador podem permitir ou inviabilizar sua utilização para um determinado fim. Como regra geral, são as seguintes as potenciais aplicações clínicas dos marcadores tumorais(4): – Triagem populacional – Diagnóstico diferencial em pacientes sintomáticos – Estadiamento clínico – Estimativa de volume da massa tumoral – Indicação prognóstica da evolução da doença – Avaliação da resposta terapêutica – Detecção precoce da recorrência – Localização de metástases – Imunorradioterapia Uma das características relevantes dos marcadores tumorais que deve ser considerada é seu tempo de permanência em circulação, medido pela meia vida, ou seja, o tempo necessário para que sua concentração se reduza à metade, a partir do momento em que a produção seja totalmente interrompida. Por exemplo, para a alfa-fetoproteína a meia-vida é de 5 dias, para o antígeno prostático específico é de 3 dias e para a gonadotrofina coriônica varia de 12 a 20 horas. Se, num caso particular, a meia-vida observada for significativamente maior do que a esperada, pode-se assumir que o tratamento não foi efetivo o suficiente para remover totalmente a massa tumoral. Os valores de referência para marcadores tumorais são estabelecidos conforme os procedimentos habituais, utilizando-se amostras populacionais saudáveis e, quando indicado, discriminando-se os grupos-controle pelo sexo e pela idade. Em geral, as análises estatísticas para definição dos valores limites se restringem ao cálculo da média e do desvio padrão e, ocasionalmente, da mediana. Assume-se, portanto, uma distribuição gaussiana para os valores, o que pode não corresponder à realidade, principalmente na população de pacientes. Estas características implicam em cuidados adicionais quando da interpretação dos resultados em casos específicos(5). Controle de qualidade O controle de qualidade para os testes de marca-dores tumorais, da mesma forma que para todos os demais procedimentos laboratoriais, deve ser conside-rado em todas as etapas do processo, iniciando-se pela fase pré-analítica que inclui: indicação e solicitação corretas do teste adequado; coleta da amostra do paciente convenientemente preparado; transporte e manuseio da amostra em condições apropriadas até a área analítica. A fase analítica compreende a escolha do método adequado; realização do ensaio, conforme protocolo técnico bem estabelecido e registro do resultado inicial. A fase pós-analítica diz respeito aos eventuais cálculos e transformações dos dados, apresentação do resultado em forma de laudo final. A partir desta fase deve ser feita a interpretação do resultado, sempre em conjunto com os dados clínicos e demais exames laboratoriais e, só então, definir-se a conduta. Tabela 1 – Resumo da história dos marcadores tumorais. ANO AUTOR MARCADOR 1846 H.Bence-Jones Proteína de Bence-Jones 1928 W.H.Brown Hormônios ectópicos 1930 B.Zondek Gonadotrofina coriônica 1932 H.Cushing Hormônio adrenocorticotrófico 1949 K.Oh-Uti Deleção de antígenos 1959 C.Markert Isoenzimas 1963 G.I.Abelev Alfa-fetoproteína 1965 P.Gold e S.Freeman Antígeno carcinoembriônico 1969 R.Heubner e G.Todaro Oncogens 1975 H.Kohler e G.Milstein Anticorpos monoclonais 1980 G.Cooper et al. Sondas oncogênicas 1985 H.Harris et al. Gens supressores Tabela 2 – Algumas enzimas utilizadas como marcadores tumorais e seus respectivos órgãos/tecidos afetados. Antígeno prostático específico próstata Creatinoquinase BB próstata, pulmão, colon, ovário Desidrogenase láctica leucemia linfoblástica, fígado Enolase neurônio-específica sistema nervoso, pele, pulmão Gama-glutamil-transferase fígado Fosfatase ácida prostática próstata Fosfatase alcalina osso, fígado, leucemias Tabela 3 – Alguns hormônios utilizados como marcadores tumorais e seus respectivos órgãos/tecidos alvo. ACTH,ADH, TSH pulmão (tumor de células pequenas) ADH pulmão, pâncreas Calcitonina carcinoma medular de tiróide Gonadotrofina coriônica células germinativas Hormônio de crescimento hipófise, rim, pulmão Paratormônio fígado, rim, pulmão, mama PIV pâncreas, pulmão (Ca broncogênico) Prolactina hipófise, rim, pulmão HpTH rim MSA hipófise ACTH = hormônio adrenocorticotrófico, ADH = hormônio antidiurético, PIV = Peptídeo intestinal vasoativo, CA = carcinoma, HpTH = peptídio paratormônio-relacionado, TSH = hormônio tiroestimulante, MSA = hormônio melanotrófico Quadro 1 – Marcadores tumorais antes dos imunoensaios. DOENÇA MARCADOR Neuroblastoma e Feocromocitoma Aminas neurogênicas Síndrome carcinóide Metabólitos da serotonina Corio-carcinoma Gonadotrofina coriônica Mieloma múltiplo Proteína de Bence-Jones Sarcoma osteogênico Fosfatase alcalina Câncer de próstata Fosfatase ácida prostática Câncer de pâncreas Amilase Quadro 2 – Marcadores amplamente utilizados e/ou aprovados pelo FDA. DOENÇA MARCADOR Carcinoma de próstata PSA, Fosf. ácida prostática Carcinoma de ovário CA-125 Carcinoma de cólon CEA Carcinoma hepatocelular AFP Tumor de células germinativas BhGC, AFP, Fosf. Alc. placentária Leucemia Transferase termina Carcinoma de mama Receptor hormonal PSA = antígeno prostático específico, CEA = antígeno carcinoembriônico, AFP = alfa-fetoproteína, BhCG = subunidade Beta da gonadotrofina coriônica Quadro 3 – Marcadores tumorais mais recentemente em uso. ÓRGÃO / TUMOR DENOMINAÇÃO Mama CA15-3, M 26, M 29, MCA, BR 27 Gastrointestinal CA 19-9, CA 195, CA 245,TAG-72 Pulmão (não células pequenas) CYFRA-21 Neuroendócrino NSE, Calcitonina Escamocelular SCC Geral Ácido Siálico, Poliaminas MCA = antígeno mucínico carcinoma-associado, TAG = glicoproteína tumor-associada, CYFRA = fragmentos solúveis de queratina, NSE = enolase neurônio-específica, SCC = carcinoma escamocelular Câncer de mama Introdução De acordo com a Sociedade Americana de Câncer, em 1999 mais de 1,2 milhão de novos diagnósticos de câncer serão feitos e cerca de 560.000 pessoas morrerão em decorrência de algum tipo da doença. A Tabela 1, abaixo, apresenta a distribuição da ocorrência de novos diagnósticos de câncer prevista para a população norte-americana feminina, neste ano. Tabela 1 – Número de novos casos de câncer em mulheres em 1999 Mama 175.000 Pulmão 78.000 Colorretal 67.000 Útero 37.000 Ovário 25.000 Linfoma não Hodgkin 24.000 Melanoma 18.000 Bexiga 15.000 Pâncreas 14.600 Tiróide 13.000 Prevenção e detecção precoce, aliadas a tratamentos cada vez mais efetivos, são os recursos mais poderosos para a redução tanto da morbidade quanto da mortalidade decorrentes dos processos neoplásicos em geral. Os marcadores tumorais constituem, portanto, em impor-tantes ferramentas auxiliares em oncologia. Especificamente em relação ao câncer de mama, observamos ser a neoplasia maligna mais comum, também na população brasileira em geral. Estima-se que, no ano passado, 30.000 novos casos tenham sido diag-nosticados e cerca de 7.000 pacientes faleceram. Ainda que não disponhamos de recursos adequa-dos para a prevenção, o diagnóstico precoce, comprova-damente, resulta em ganho na sobrevida e na qualidade de vida das pacientes. Em relação ao diagnóstico, a mamografia permanece como sendo o melhor método para a detecção precoce, como comprovado por Baker1, com uma sensibilidade entre 89% e 95%. Quando a detecção do câncer ocorre por palpação de nódulo, cerca de 43% das pacientes se apresentam com comprometimento de linfonodos; por ocasião do diagnóstico por mamografia, este contingente cai para cerca de 16%2. A termografia possui sensibilidade próxima a 42%3 e a transiluminação menor que 30%4. A despeito destes números, tendo em vista o elevado custo da mamografia, as dificuldades sócioeconômicas existentes e sua baixa sensibilidade, o auto-exame deve continuar a ser estimulado em nosso meio por propiciar diagnóstico relativamente incipiente5. Recentes avanços em genética molecular permitiram um melhor entendimento da gênese desta neoplasia. Seu desenvolvimento parece decorrer da ativação ou altera-ção da expressão de oncogenes e/ou perda ou inativação de genes supressores. Diversos marcadores têm sido utilizados no diag-nóstico e, principalmente, no acompanhamento de pacientes portadores do câncer de mama, embora nenhum deles tenha sensibilidade e especificidade consideradas ideais. Antígeno carcinoembriônico (CEA) O CEA é uma glicoproteína com massa molecular de 150 a 30 kd, contendo 45% a 55% de carboidratos. Pode estar elevada em diversas neoplasias, sobretudo nas do trato gastrointestinal – colorretal e pâncreas, principalmente -, mas também em câncer de pulmão, ovário, mama e útero, carecendo, portanto, de especifi-cidade de tecido e tipo de tumor. Níveis elevados de CEA também podem ser observados em doenças não neoplásicas, tais como cirrose hepática, enfisema pulmonar, doença inflamatória intestinal e outras condições benignas da mama, caracte-rizando a inespecificidade também em termos de natu-reza da doença. Na população normal o limite de referência é até 3 mg/L para nãofumantes e até 5 mg/L para fumantes. Devido à elevação do CEA em doenças benignas e à ocorrência de tumores malignos que não produzem este antígeno, as taxas de resultados falso-positivos e falso-negativos não permitem que este marcador seja utilizado para o diagnóstico. Em câncer de mama, a elevação do CEA, em geral, associa-se com doença metastática, enquanto que doença em estágio inicial ou localizada não apresenta elevação significativa. Assim sendo, o CEA é mais útil na monitorização da eficiência da terapêutica do câncer metastático e como um possível marcador do apare-cimento de metástases ósseas e pulmonares. Ocorrência de níveis elevados de CEA em doenças não neoplásicas: Cirrose hepática 45% Enfisema pulmonar 30% Colite ulcerativa 15% Doença benigna da mama 15% Polipose retal 5% Características do CEA – Pode estar elevado em fumantes – Pode estar elevado em patologias benignas – Tumores indiferenciados ou pouco diferenciados não o produzem – Cinéticas de elevação e decaimento variam de paciente para paciente – Pode ocorrer interferência de anticorpos anti-camundongo – Diferentes métodos fornecem diferentes resultados (clinicamente concordantes) Distribuição percentual dos diferentes valores de CEA em relação à situação clínica. Nível de CEA (mg/L) 0,0 – 3,0 3,1 – 5,0 5,1 – 10,0 > 10,0 Controles Não fumantes 95,4 4,6 0,0 0,0 Fumantes 69,3 21,3 8,7 7,0 Total 82,4 13,0 4,3 0,3 Doença maligna Colorretal 31,9 9,6 11,1 47,4 Pulmonar 38,8 15,7 13,2 32,2 Mamária 62,5 12,5 9,2 15,8 Gástrica 44,6 17,9 17,9 19,6 Ovariana 93,3 6,7 0,0 0,0 Outras, ginecológicas 73,7 5,3 0,0 21,1 Doença benigna Cirrose 53,2 19,4 22,6 5,8 Colite ulcerativa 84,8 10,9 4,3 0,0 Pólipo retal 77,6 13,8 5,2 3,4 Pulmonar 63,2 22,8 12,3 1,8 Hepatite 67,8 16,9 8,5 6,8 Antígenos carboidratados Os marcadores da família dos carboidratos são mucinas de alto peso molecular, identificados pelas siglas CA 15-3, CA 27-29, MCA e CA 549, expressos pelo epitélio mamário. Anticorpos monoclonais foram desenvolvidos contra estes antígenos, dos quais CA 15-3 e CA 27-29 têm sido mais amplamente utilizados na clínica e serão aqui apresentados em maiores detalhes. CA 15-3 O CA 15-3 é detectado e quantificado com ensaios que empregam dois anticorpos monoclonais, produzidos contra um extrato de tecido de câncer de mama humano metastático para o fígado. Como os demais marcadores, não deve ser utilizado para diagnóstico, mas apenas para monitorização da terapia, detecção de recidivas e avaliação da progressão da doença. Uma mudança significativa, definida como um aumento superior a 25% na concentração do CA 15-3, correlaciona-se com progressão da doença em 80% a 90% dos casos. Sua redução, também nestes níveis, está associada à regressão em 70% a 80% das vezes. Considerando-se o limite de referência até 28 U/mL, este marcador pode ser encontrado em níveis elevados apenas em cerca de 20% das pacientes com câncer mamário no estágio I. O CA 15-3 é considerado mais sensível e mais específico do que o CEA para o seguimento de pacientes com câncer de mama. A Tabela 2 apresenta a frequência com que se observa níveis elevados de CA 15-3 em outras neoplasias. Tabela 2 – Frequência de CA 15-3 elevado em outras neoplasias. Primário de mama 20% Metastático de mama 70% Pâncreas 80% Pulmão 70% Ovário 64% Colorretal 63% Fígado 28% CA 27.29 O CA 27-29 é detectado e quantificado por um teste que utiliza anticorpo monoclonal produzido contra ascite de pacientes com câncer de mama metastático. À semelhança do CA 15-3, o teste para CA 27-29 também não tem sensibilidade e especificidade suficientes para ser utilizado como um teste diagnóstico, tendo sido liberado pelo FDA para a detecção de recorrência de câncer de mama. Deste modo, a sua indicação fica limitada ao seguimento de pacientes com diagnóstico da neoplasia. Sua maior vantagem é possibilitar a detecção precoce de recorrências, permitindo tempo suficiente para decisões terapêuticas apropriadas, sendo considerado melhor do que o CA 15-3 para esta finalidade6. Características do CA 27-29, para a detecção de recorrência: Sensibilidade 58% Especificidade 98% Valor preditivo positivo 83% Valor preditivo negativo 93% O valor de referência é até 38 U/mL. Estes marcadores apresentam boa correspondência com o curso clínico da doença, havendo, em geral, um paralelo entre sua concentração sérica e a atividade da doença. Entretanto, deve ser assinalado que nem todos os tumores expressam grandes quantidades destes antígenos, mesmo quando em formas metastáticas e disseminadas, fazendo com que um teste negativo tenha relevância clínica limitada. A despeito das inconsistências observadas, pode-se dizer que pacientes que inicialmente apresentam um marcador tumoral em nível elevado e que se normaliza com a intervenção terapêutica, invariavelmente têm uma resposta favorável. Por outro lado, um marcador tumoral persistentemente elevado, ou em ascensão, associa-se com alta probabilidade de doença recorrente ou progressi-va e deve ser visto como altamente suspeito de doença metastática. Receptores hormonais Os receptores para estrógenos e progesterona são pesquisados por imunoistoquímica, empregando-se anticorpos específicos, em preparações de tecido e têm sido utilizados em câncer de mama como uma ferramenta para predizer a resposta à terapêutica específica. Pacientes com receptores de estrógeno e proges-terona positivos tendem a responder à hormonioterapia. Por outro lado, pacientes com negatividade para estes receptores devem ser tratadas com outras modalidades terapêuticas, como quimioterapia. Além disso, os recep-tores hormonais podem fornecer informações relativas ao prognóstico: pacientes com positividade para recep-tores tendem a ter maior tempo de sobrevida. Uso combinado de marcadores tumorais para câncer de mama. SENSIBILIDADE(S) ESPECIFICIDADE(S) (S X E) Um marcador CA M29 0,71 1,00 0,71 CA 15-3 0,79 0,87 0,69 CA 549 0,71 0,94 0,67 CA 27-29 0,70 0,92 0,64 CEA 0,68 0,88 0,60 CA M26 0,55 1,00 0,55 Dois marcadores CA M29, CA M26 0,77 1,00 0,77 CA 15-3, CA 549 0,84 0,87 0,73 CA M26, CA 15-3 0,85 0,84 0,71 CA 549, CEA 0,86 0,83 0,71 CA M29, CA 15-3 0,80 0,88 0,70 CA 15-3, CEA 0,88 0,77 0,68 Três marcadores CA 549,CAM26,CEA 0,91 0,83 0,76 CA 549,CAM29,CEA 0,88 0,83 0,73 CA15-3,CAM26,CEA 0,91 0,77 0,70 CA15-3,CAM29,CEA 0,89 0,77 0,69 CA549,CA15-3,CEA 0,91 0,75 0,69 Ref.: Schwartz M.K. Scand J Clin Lab Invest 55 Suppl 22:5-14, 1995 CÂNCER DE PRÓSTATA Introdução De acordo com a Sociedade Americana de Câncer, em 1999 mais de 1,2 milhão de novos diagnósticos de câncer serão feitos e cerca de 560.000 pessoas morrerão em decorrência de algum tipo da doença. A Tabela 1, abaixo, apresenta a distribuição da ocorrência de novos diagnósticos de câncer prevista para a população norte-americana masculina, neste ano. Tabela 1 – Número de novos casos de câncer em homens em 1999. Próstata 180.000 Pulmão/brônquios 95.000 Cólon e reto 62.000 Bexiga 39.000 Linfoma não Hodgkins 33.000 Melanoma 26.000 Cavidade oral 20.000 Rins 18.000 Leucemia 17.000 Pâncreas 14.000 Antígeno prostático específico (PSA) O PSA foi descrito em 1971 por Hara e col.1 sendo, posteriormente caracterizado como uma proteína com 240 aminoácidos, com ação enzimática equivalente às proteases e pertencendo à família das calicreínas. Em 1979 foram descritos os primeiros testes imunoenzimáticos sensíveis para quantificar o PSA com limite de detecção entre 0,1 e 0,2 ng/mL. Inicialmente, considerava-se que o PSA fosse específico de tecido prostático, mas, a partir do emprego de metodologias mais sensíveis e da realização de estudos imunoistoquímicos, ficou evidente a presença desta proteína em células de glândulas anais. Posteri-ormente, vários autores descreveram a presença de PSA em outros tecidos, tais como glândulas periuretrais, ma-márias, salivares, pancreáticas e nos demais líquidos cor-porais além do soro, como leite, líquido amniótico e urina. Formas de PSA O PSA existe no soro de duas formas: livre e complexado. No indivíduo normal, cerca de 85% a 90% do PSA total dosável estão complexados com proteínas inibidoras de protease, principalmente alfa-1-antiqui-miotripsina e, em menor quantidade, com alfa-1-antitri-psina. Os 10% a 15% restantes permanecem livres, em circulação. Uma quantidade não mensurável pelos métodos habituais circula complexado à alfa-2-macro-globulina. O PSA no diagnóstico do câncer de próstata Cerca de 80% dos pacientes com câncer de próstata apresentam, quando do diagnóstico, PSA sérico total acima de 4,0 ng/mL, considerado como valor de corte. Por outro lado, cerca de 85% dos pacientes com hiperplasia benigna da próstata também terão valores acima de 4,0 ng/mL. Estes dados evidenciam, claramente, que o PSA total não possui acurácia diagnóstica suficiente para ser utilizado isoladamente, fornecendo um valor preditivo positivo da ordem de 50%2. Valores elevados de PSA total podem ser observados em várias condições, nas quais os níveis alcançados e o tempo de permanência acima do limite considerado normal são extremamente variados. A Tabela 2 relaciona algumas destas situações, a elevação e o tempo médio requerido para o retorno aos níveis basais. Em casos particulares, especialmente em pacientes portadores de hipertrofia benigna, a prática de hipismo e o uso de bicicleta, mesmo ergométrica, têm sido respon-sabilizados por elevações significativas de PSA, devendo ser respeitado um intervalo de, pelo menos, duas semanas entre estas atividades e a coleta de sangue para o exame. Deve ser lembrado que de 65% a 75% dos homens com moderada elevação do PSA total não desen-volverão a doença e que aproximadamente 15% dos pacientes com câncer de próstata manterão níveis normais, independente da evolução fatal. A partir destas constatações e com o objetivo de melhorar a acurácia diagnóstica, outros parâmetros foram desenvolvidos, tais como os cálculos da densidade do PSA, da velo-cidade do PSA, da relação entre o PSA livre e o total e a adoção de valores de referência específicos para diferentes faixa etárias. Tabela 2 – Causas de elevação do PSA, intensidade e tempo para retorno aos níveis basais. Condição Efeito sobre o nível do PSA total Tempo médio para retornar aos níveis basais Câncer da próstata elevação moderada a grande – Hipertrofia benigna da próstata elevação moderada Ejaculação recente (24-48 h) elevação moderada 24 – 48 horas Retenção urinária aguda eleva de 5 a 7 vezes 6 semanas Prostatite bacteriana aguda eleva de 5 a 7 vezes 6 semanas Toque retal elevação variável 24 – 48 horas Massagem prostática elevação moderada a grande 6 semanas Biópsia prostática transretal elevação moderada a grande 6 semanas Ressecção transuretral elevação moderada a grande 6 semanas Densidade do PSA A densidade do PSA é obtida pelo cálculo da relação entre o valor numérico da concentração sérica do PSA total e o valor numérico do volume prostático, avaliado por ultra-som transretal. Tem sido considerado como valor de corte 0,15, sendo que relações abaixo deste limites são compatíveis com hipertrofia benigna da próstata e relações superiores com câncer de próstata. Densidade do PSA – Relação entre PSA sérico e volume prostático – Aumenta especificidade – Reduz sensibilidade (perda de 47%) – Aumenta custos – Limite de referência 15% Velocidade do PSA Consiste na medida da variação da concentração do PSA total, no intervalo de um ano. É um parâmetro útil na avaliação da presença de doença residual em pacientes submetidos à prostatectomia. Possui o incon-veniente da necessidade de dosagens seriadas, ao longo do tempo, com um ano de intervalo. Velocidade do PSA – Limite de referência 0,75 ng/mL/ano – Para PSA entre 4,1 e 10 ng/mL – sensibilidade de 79 % – especificidade de 90 % Frequência de dosagens do PSA total As recomendações para a frequência com que devem ser feitas as dosagens de PSA total em pacientes submetidos à prostatectomia são as seguintes: pré-operatório, 3 semanas após a cirurgia, a cada 3 meses no primeiro ano, a cada 4 meses no segundo ano, a cada 6 meses do terceiro ao quinto ano e anualmente, após o quinto ano. Relação entre PSA livre e PSA total Esta relação confere maior acurácia diagnóstica quando o PSA total estiver entre 4,0 e 10 ng/mL5. Temos utilizado o valor de 15%, mas este valor de corte ainda é controverso, dadas as implicações na sensibilidade e na especificidade, como pode ser visto na Tabela 3. Tabela 3 – Sensibilidade, especificidade, valores preditivos positivo e negativo e eficiência diagnóstica com diferentes níveis de corte para a relação PSA livre/PSA total. Parâmetro 15% 17% 19% 21% Sensibilidade 72% 76% 90% 93% Especificidade 83% 67% 50% 50% Valor preditivo positivo 91% 85% 81% 81% Valor preditivo negativo 56% 53% 67% 75% Eficiência 76% 73% 78% 80% PSA LIVRE – Relação entre PSA livre e total – Menor em carcinoma – Aumenta pouco a especificidade – Reduz a sensibilidade – Aumenta o custo Indicação de biópsia Pacientes com toque retal normal, PSA total entre 4,1 e 10 ng/mL, ultra-som transretal normal e densidade do PSA acima de 0,15. Alguns autores têm preconizado a realização de biópsia quando a relação PSA livre/PSA total for inferior a 27%, se o PSA total estiver entre 2,6 e 4,0 ng/mL. Valores de referência para o PSA Ainda que haja diferenças em relação à idade e raça, na prática diária, aceita-se como intervalo de normalidade até 4,0 ng/dL para o PSA total. A probabilidade da existência de câncer varia com o grau de elevação. Para níveis entre 4,0 e 10,0 ng/dL, o valor preditivo positivo é de 25% a 35%, o que significa em 65% a 75% dos casos se trata de resultado falso-positivo para este diagnóstico. Quando o PSA total estiver acima de 10,0 ng/dL, a probabilidade de câncer estará entre 42% e 64%. Quanto mais elevada for a concentração sérica do PSA, maior será a chance de existir metástase12,13. A Tabela 4 apresenta alguns valores de referência para o PSA total, em diferentes faixas etárias e na população de brancos e negros. Características do PSA – Meia vida diferente entre formas livres e comple-xadas – Estabiliza em 2 – 3 semanas após cirurgia – Estabiliza 2m 2 – 6 meses após radioterapia – Pode ocorrer elevação após exame digital, ultra som transretal e biópsia – Não possui ritmo circadiano – Variação biológica de 6 % a 7 % – Após 24 horas de internação valores podem cair até 50 % (média 18 %) – Diferentes métodos podem fornecer diferentes re-sultados – Relação livre/complexado pode interferir no resultado A Tabela 5 apresenta a distribuição percentual dos diferentes valores do PSA, observados em diferentes situações clínicas, evidenciando-se a relativa inespeci-ficidade deste marcador para processos neoplásicos. Trabalhos recentes têm evidenciado a utilidade da realização da dosagem do PSA sérico rotineiramente, associado ao toque retal, em indivíduos acima de 50 anos, ou acima de 40 anos se houver parente de primeiro grau acometido de câncer de próstata5,6. Idade (anos) Oesterling* 6 Morgan* 7 Morgan** 7 Tabela 4 – Valores de referência para o PSA total, em diferentes faixas etárias e grupos étnicos. IDADE (anos) Oesterling* 6 Morgan* 7 Morgan* 7 40 – 49 0,0 – 2,5 ng/mL 0,0 – 2,5 ng/mL 0,0 – 2,0 ng/mL 50 – 59 0,0 – 3,5 ng/mL 0,0 – 3,5 ng/mL 0,0 – 4,0 ng/mL 60 – 69 0,0 – 4,5 ng/mL 0,0 – 3,5 ng/mL 0,0 – 4,5 ng/mL 70 – 79 0,0 – 6,5 ng/mL 0,0 – 3,5 ng/mL 0,0 – 5,5 ng/mL (*) Brancos (**) Negros Tabela 5 – Distribuição percentual dos diferentes valores de PSA em relação à situação clínica. Nível de PSA (ng/mL) 0,0-4,1 4,1-10,0 10,1-30,0 30,1-60,0 > 60,0 Controles < 40 anos 100,0 0,0 0,0 0,0 0,0 > 40 anos 96,0 3,5 0,5 0,0 0,0 CA de próstata Estágio A 60,0 30,8 7,7 0,0 1,5 Estágio B 37,5 26,1 23,9 3,4 9,1 Estágio C 19,7 23,7 30,3 13,2 13,2 Estágio D 14,7 18,8 16,2 10,3 47,1 CA geniturinário 88,3 10,0 1,7 0,0 0,0 Doença benígna HPB 78,5 16,3 4,3 1,0 0,0 Prostatite 81,2 12,5 6,2 0,0 0,0 Geniturinária 86,1 8,9 5,0 0,0 0,0 Renal 87,3 10,9 2,0 0,0 0,0 Cirrose 91,4 8,6 0,0 0,0 0,0 HPB = hiperplasia benígna da próstata Controle de qualidade O controle de qualidade para os testes de marca-dores tumorais, da mesma forma que para todos os demais procedimentos laboratoriais, deve ser considerado em todas as etapas do processo, iniciando-se pela fase pré analítica que inclui: indicação e solicitação corretas do teste adequado; coleta da amostra do paciente conveni-entemente preparado; transporte e manuseio da amostra em condições apropriadas até a área analítica. A fase analítica compreende a escolha do método adequado; realização do ensaio conforme protocolo técnico bem estabelecido e registro do resultado inicial. A fase pós-analítica diz respeito aos eventuais cálculos e transformações dos dados, apresentação do resultado em forma de laudo final. A partir desta fase deve ser feita a interpretação do resultado, sempre em conjunto com os dados clínicos e demais exames laboratoriais e, só então, definir-se a conduta Estes marcadores apresentam boa correspondência com o curso clínico da doença, havendo, em geral, um paralelo entre sua concentração sérica e a atividade da doença. Entretanto, deve ser assinalado que nem todos os tumores expressam grandes quantidades destes antígenos, mesmo quando em formas metastáticas e disseminadas, fazendo com que um teste negativo tenha relevância clínica limitada. A despeito das inconsistências observadas, pode-se dizer que pacientes que inicialmente apresentam um marcador tumoral em nível elevado e que se normaliza com a intervenção terapêutica, invariavelmente têm uma resposta favorável. Por outro lado, um marcador tumoral persistentemente elevado, ou em ascensão, associa-se com alta probabilidade de doença recorrente ou progressi-va e deve ser visto como altamente suspeito de doença metastática. Receptores hormonais Os receptores para estrógenos e progesterona são pesquisados por imunoistoquímica, empregando-se anticorpos específicos, em preparações de tecido e têm sido utilizados em câncer de mama como uma ferramenta para predizer a resposta à terapêutica específica. Pacientes com receptores de estrógeno e proges-terona positivos tendem a responder à hormonioterapia. Por outro lado, pacientes com negatividade para estes receptores devem ser tratadas com outras modalidades terapêuticas, como quimioterapia. Além disso, os recep-tores hormonais podem fornecer informações relativas ao prognóstico: pacientes com positividade para recep-tores tendem a ter maior tempo de sobrevida. Uso combinado de marcadores tumorais para câncer de mama. SENSIBILIDADE(S) ESPECIFICIDADE(S) (S X E) Um marcador CA M29 0,71 1,00 0,71 CA 15-3 0,79 0,87 0,69 CA 549 0,71 0,94 0,67 CA 27-29 0,70 0,92 0,64 CEA 0,68 0,88 0,60 CA M26 0,55 1,00 0,55 Dois marcadores CA M29, CA M26 0,77 1,00 0,77 CA 15-3, CA 549 0,84 0,87 0,73 CA M26, CA 15-3 0,85 0,84 0,71 CA 549, CEA 0,86 0,83 0,71 CA M29, CA 15-3 0,80 0,88 0,70 CA 15-3, CEA 0,88 0,77 0,68 Três marcadores CA 549,CAM26,CEA 0,91 0,83 0,76 CA 549,CAM29,CEA 0,88 0,83 0,73 CA15-3,CAM26,CEA 0,91 0,77 0,70 CA15-3,CAM29,CEA 0,89 0,77 0,69 CA549,CA15-3,CEA 0,91 0,75 0,69 Ref.: Schwartz M.K. Scand J Clin Lab Invest 55 Suppl 22:5-14, 1995 CÂNCER DE PRÓSTATA Introdução De acordo com a Sociedade Americana de Câncer, em 1999 mais de 1,2 milhão de novos diagnósticos de câncer serão feitos e cerca de 560.000 pessoas morrerão em decorrência de algum tipo da doença. A Tabela 1, abaixo, apresenta a distribuição da ocorrência de novos diagnósticos de câncer prevista para a população norte-americana masculina, neste ano. Tabela 1 – Número de novos casos de câncer em homens em 1999. Próstata 180.000 Pulmão/brônquios 95.000 Cólon e reto 62.000 Bexiga 39.000 Linfoma não Hodgkins 33.000 Melanoma 26.000 Cavidade oral 20.000 Rins 18.000 Leucemia 17.000 Pâncreas 14.000 Antígeno prostático específico (PSA) O PSA foi descrito em 1971 por Hara e col.1 sendo, posteriormente caracterizado como uma proteína com 240 aminoácidos, com ação enzimática equivalente às proteases e pertencendo à família das calicreínas. Em 1979 foram descritos os primeiros testes imunoenzimáticos sensíveis para quantificar o PSA com limite de detecção entre 0,1 e 0,2 ng/mL. Inicialmente, considerava-se que o PSA fosse específico de tecido prostático, mas, a partir do emprego de metodologias mais sensíveis e da realização de estudos imunoistoquímicos, ficou evidente a presença desta proteína em células de glândulas anais. Posteri-ormente, vários autores descreveram a presença de PSA em outros tecidos, tais como glândulas periuretrais, ma-márias, salivares, pancreáticas e nos demais líquidos cor-porais além do soro, como leite, líquido amniótico e urina. Formas de PSA O PSA existe no soro de duas formas: livre e complexado. No indivíduo normal, cerca de 85% a 90% do PSA total dosável estão complexados com proteínas inibidoras de protease, principalmente alfa-1-antiqui-miotripsina e, em menor quantidade, com alfa-1-antitri-psina. Os 10% a 15% restantes permanecem livres, em circulação. Uma quantidade não mensurável pelos métodos habituais circula complexado à alfa-2-macro-globulina. O PSA no diagnóstico do câncer de próstata Cerca de 80% dos pacientes com câncer de próstata apresentam, quando do diagnóstico, PSA sérico total acima de 4,0 ng/mL, considerado como valor de corte. Por outro lado, cerca de 85% dos pacientes com hiperplasia benigna da próstata também terão valores acima de 4,0 ng/mL. Estes dados evidenciam, claramente, que o PSA total não possui acurácia diagnóstica suficiente para ser utilizado isoladamente, fornecendo um valor preditivo positivo da ordem de 50%2. Valores elevados de PSA total podem ser observados em várias condições, nas quais os níveis alcançados e o tempo de permanência acima do limite considerado normal são extremamente variados. A Tabela 2 relaciona algumas destas situações, a elevação e o tempo médio requerido para o retorno aos níveis basais. Em casos particulares, especialmente em pacientes portadores de hipertrofia benigna, a prática de hipismo e o uso de bicicleta, mesmo ergométrica, têm sido respon-sabilizados por elevações significativas de PSA, devendo ser respeitado um intervalo de, pelo menos, duas semanas entre estas atividades e a coleta de sangue para o exame. Deve ser lembrado que de 65% a 75% dos homens com moderada elevação do PSA total não desen-volverão a doença e que aproximadamente 15% dos pacientes com câncer de próstata manterão níveis normais, independente da evolução fatal. A partir destas constatações e com o objetivo de melhorar a acurácia diagnóstica, outros parâmetros foram desenvolvidos, tais como os cálculos da densidade do PSA, da velo-cidade do PSA, da relação entre o PSA livre e o total e a adoção de valores de referência específicos para diferentes faixa etárias. Tabela 2 – Causas de elevação do PSA, intensidade e tempo para retorno aos níveis basais. Condição Efeito sobre o nível do PSA total Tempo médio para retornar aos níveis basais Câncer da próstata elevação moderada a grande – Hipertrofia benigna da próstata elevação moderada Ejaculação recente (24-48 h) elevação moderada 24 – 48 horas Retenção urinária aguda eleva de 5 a 7 vezes 6 semanas Prostatite bacteriana aguda eleva de 5 a 7 vezes 6 semanas Toque retal elevação variável 24 – 48 horas Massagem prostática elevação moderada a grande 6 semanas Biópsia prostática transretal elevação moderada a grande 6 semanas Ressecção transuretral elevação moderada a grande 6 semanas Densidade do PSA A densidade do PSA é obtida pelo cálculo da relação entre o valor numérico da concentração sérica do PSA total e o valor numérico do volume prostático, avaliado por ultra-som transretal. Tem sido considerado como valor de corte 0,15, sendo que relações abaixo deste limites são compatíveis com hipertrofia benigna da próstata e relações superiores com câncer de próstata. Densidade do PSA – Relação entre PSA sérico e volume prostático – Aumenta especificidade – Reduz sensibilidade (perda de 47%) – Aumenta custos – Limite de referência 15% Velocidade do PSA Consiste na medida da variação da concentração do PSA total, no intervalo de um ano. É um parâmetro útil na avaliação da presença de doença residual em pacientes submetidos à prostatectomia. Possui o incon-veniente da necessidade de dosagens seriadas, ao longo do tempo, com um ano de intervalo. Velocidade do PSA – Limite de referência 0,75 ng/mL/ano – Para PSA entre 4,1 e 10 ng/mL – sensibilidade de 79 % – especificidade de 90 % Frequência de dosagens do PSA total As recomendações para a frequência com que devem ser feitas as dosagens de PSA total em pacientes submetidos à prostatectomia são as seguintes: pré-operatório, 3 semanas após a cirurgia, a cada 3 meses no primeiro ano, a cada 4 meses no segundo ano, a cada 6 meses do terceiro ao quinto ano e anualmente, após o quinto ano. Relação entre PSA livre e PSA total Esta relação confere maior acurácia diagnóstica quando o PSA total estiver entre 4,0 e 10 ng/mL5. Temos utilizado o valor de 15%, mas este valor de corte ainda é controverso, dadas as implicações na sensibilidade e na especificidade, como pode ser visto na Tabela 3. Tabela 3 – Sensibilidade, especificidade, valores preditivos positivo e negativo e eficiência diagnóstica com diferentes níveis de corte para a relação PSA livre/PSA total. Parâmetro 15% 17% 19% 21% Sensibilidade 72% 76% 90% 93% Especificidade 83% 67% 50% 50% Valor preditivo positivo 91% 85% 81% 81% Valor preditivo negativo 56% 53% 67% 75% Eficiência 76% 73% 78% 80% PSA LIVRE – Relação entre PSA livre e total – Menor em carcinoma – Aumenta pouco a especificidade – Reduz a sensibilidade – Aumenta o custo Indicação de biópsia Pacientes com toque retal normal, PSA total entre 4,1 e 10 ng/mL, ultra-som transretal normal e densidade do PSA acima de 0,15. Alguns autores têm preconizado a realização de biópsia quando a relação PSA livre/PSA total for inferior a 27%, se o PSA total estiver entre 2,6 e 4,0 ng/mL. Valores de referência para o PSA Ainda que haja diferenças em relação à idade e raça, na prática diária, aceita-se como intervalo de normalidade até 4,0 ng/dL para o PSA total. A probabilidade da existência de câncer varia com o grau de elevação. Para níveis entre 4,0 e 10,0 ng/dL, o valor preditivo positivo é de 25% a 35%, o que significa em 65% a 75% dos casos se trata de resultado falso-positivo para este diagnóstico. Quando o PSA total estiver acima de 10,0 ng/dL, a probabilidade de câncer estará entre 42% e 64%. Quanto mais elevada for a concentração sérica do PSA, maior será a chance de existir metástase12,13. A Tabela 4 apresenta alguns valores de referência para o PSA total, em diferentes faixas etárias e na população de brancos e negros. Características do PSA – Meia vida diferente entre formas livres e comple-xadas – Estabiliza em 2 – 3 semanas após cirurgia – Estabiliza 2m 2 – 6 meses após radioterapia – Pode ocorrer elevação após exame digital, ultra som transretal e biópsia – Não possui ritmo circadiano – Variação biológica de 6 % a 7 % – Após 24 horas de internação valores podem cair até 50 % (média 18 %) – Diferentes métodos podem fornecer diferentes re-sultados – Relação livre/complexado pode interferir no resultado A Tabela 5 apresenta a distribuição percentual dos diferentes valores do PSA, observados em diferentes situações clínicas, evidenciando-se a relativa inespeci-ficidade deste marcador para processos neoplásicos. Trabalhos recentes têm evidenciado a utilidade da realização da dosagem do PSA sérico rotineiramente, associado ao toque retal, em indivíduos acima de 50 anos, ou acima de 40 anos se houver parente de primeiro grau acometido de câncer de próstata5,6. Idade (anos) Oesterling* 6 Morgan* 7 Morgan** 7 Tabela 4 – Valores de referência para o PSA total, em diferentes faixas etárias e grupos étnicos. IDADE (anos) Oesterling* 6 Morgan* 7 Morgan* 7 40 – 49 0,0 – 2,5 ng/mL 0,0 – 2,5 ng/mL 0,0 – 2,0 ng/mL 50 – 59 0,0 – 3,5 ng/mL 0,0 – 3,5 ng/mL 0,0 – 4,0 ng/mL 60 – 69 0,0 – 4,5 ng/mL 0,0 – 3,5 ng/mL 0,0 – 4,5 ng/mL 70 – 79 0,0 – 6,5 ng/mL 0,0 – 3,5 ng/mL 0,0 – 5,5 ng/mL (*) Brancos (**) Negros Tabela 5 – Distribuição percentual dos diferentes valores de PSA em relação à situação clínica. Nível de PSA (ng/mL) 0,0-4,1 4,1-10,0 10,1-30,0 30,1-60,0 > 60,0 Controles < 40 anos 100,0 0,0 0,0 0,0 0,0 > 40 anos 96,0 3,5 0,5 0,0 0,0 CA de próstata Estágio A 60,0 30,8 7,7 0,0 1,5 Estágio B 37,5 26,1 23,9 3,4 9,1 Estágio C 19,7 23,7 30,3 13,2 13,2 Estágio D 14,7 18,8 16,2 10,3 47,1 CA geniturinário 88,3 10,0 1,7 0,0 0,0 Doença benígna HPB 78,5 16,3 4,3 1,0 0,0 Prostatite 81,2 12,5 6,2 0,0 0,0 Geniturinária 86,1 8,9 5,0 0,0 0,0 Renal 87,3 10,9 2,0 0,0 0,0 Cirrose 91,4 8,6 0,0 0,0 0,0 HPB = hiperplasia benígna da próstata Controle de qualidade O controle de qualidade para os testes de marca-dores tumorais, da mesma forma que para todos os demais procedimentos laboratoriais, deve ser considerado em todas as etapas do processo, iniciando-se pela fase pré analítica que inclui: indicação e solicitação corretas do teste adequado; coleta da amostra do paciente conveni-entemente preparado; transporte e manuseio da amostra em condições apropriadas até a área analítica. A fase analítica compreende a escolha do método adequado; realização do ensaio conforme protocolo técnico bem estabelecido e registro do resultado inicial. A fase pós-analítica diz respeito aos eventuais cálculos e transformações dos dados, apresentação do resultado em forma de laudo final. A partir desta fase deve ser feita a interpretação do resultado, sempre em conjunto com os dados clínicos e demais exames laboratoriais e, só então, definir-se a conduta |
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