Revistas Fase R003 Id Materia 4474






Artigo Original
Avaliação da dor no pós-operatório imediato de herniorrafias inguinais
Pain evaluation in the immediate postoperative period of inguinal herniorraphy


André Felipe Mazullo Cernicchiaro
Médico.
Leandro Totti Cavazzola
Pós-doutorado em Cirurgia Minimamente Invasiva pela Case Western Reserve University em Cleveland – Ohio. Mestre e doutor em Medicina pela UFRGS. Professor adjunto da Universidade Luterana do Brasil.
Fernando Rogério Bellony Farias
Mestre em Medicina pela FFFCMPA. Chefe do Serviço de Cirurgia Digestiva ULBRA.
Leandro César Dias Gomes
Mestre em Saúde Coletiva pela Universidade Luterana do Brasil. Professor adjunto de Cirurgia Geral e Trauma na ULBRA.
Osvaldo Neto
Médico.
Juliano Hermes Maeso Montes
Medicina da Universidade Luterana da Brasil (ULBRA).
Universidade Luterana do Brasil (ULBRA).

Endereço para correspondência: André Felipe Mazullo Cernicchiaro – Praça Almirante Tamandaré, 46 – apto 301 – Bairro Petrópolis – CEP 90460-180 – Porto Alegre – RS – Brasil – Tels.: (51) 2111-7734 / (51) 8120-8613 – E-mail: andré-fmc@hotmail.com

Recebido para publicação em 11/2008. Aceito em 04/2009.

Copyright Moreira Jr. Editora. Todos os direitos reservados.

RBM Nov 10 V 67 Suplemento

Indexado LILACS: S0034-72642010006200002

Unitermos: hérnia inguinal, avaliação da dor, tratamento cirúrgico.
Unterms: inguinal hernia, evaluation of pain, surgical treatment.

Numeração de páginas na revista impressa: 12 à 16

Resumo


Introdução: Dor no pós-operatório imediato de herniorrafias inguinais é um achado comum à realização do procedimento. Dessa forma, sua avaliação após a cirurgia de correção de hérnia, seja pela técnica videolaparoscópica ou pela técnica de Lichtenstein é de extrema importância para auxiliar o cirurgião na escolha do procedimento mais adequado para cada situação.

Objetivo: Avaliar a intensidade da dor no pós-operatório imediato do reparo cirúrgico das hérnias inguinais, comparando a técnica de Lichtenstein com a cirurgia videolaparoscópica.

Material e métodos: O trabalho foi realizado prospectivamente utilizando-se um protocolo previamente desenvolvido pelo autor com a utilização de uma Escala Análogo Visual (EAV). Os pacientes dos dois grupos (cirurgia convencional e cirurgia videolaparoscópica) foram pareados por faixa etária, sexo e Índice de Massa Corporal (IMC). Através da EAV, os pacientes determinavam a intensidade da dor (0 – 10) no pós-operatório imediato (24 horas após a realização do procedimento). A análise dos dados foi feita através do teste t de Student.

Resultados: Foram analisados 62 pacientes, no entanto 22 foram excluídos pela impossibilidade de pareamento. Os 40 pacientes participantes deste estudo foram pareados por faixa etária, sexo e IMC. No grupo de pacientes que realizou a técnica de Lichtenstein (20 pacientes) a nota média para avaliação da dor foi de 3,9, enquanto o grupo que realizou a cirurgia por vídeo (20 pacientes) teve uma média de 4,1.

Discussão e conclusão: No presente estudo não há diferença entre a intensidade de dor causada pelo procedimento convencional e videolaparoscópico após 24 horas da realização da cirurgia.

Introdução

A avaliação da dor nos pacientes submetidos à herniorrafia inguinal se constitui de um grande desafio, dada a sua alta complexidade e subjetividade(1). Assim, as escalas análogas visuais de dor atuam como importantes instrumentos para tornar essa manifestação mais objetiva(2-4). A dor pós-operatória é, ainda hoje, uma das situações mais comuns e prevalentes na prática diária(5). É aceito que ela contribua para um aumento da morbidade e do tempo de recuperação do doente, repercutindo em diversos sistemas no organismo, tais como o respiratório, cardiovascular, gastrointestinal, endocrinológico, metabólico e psicológico. Sendo assim, através da utilização de escalas análogas visuais, podemos quantificar a dor nesses pacientes(6), comparando qual procedimento, convencional ou videolaparoscópico, causa menos dor quando realizados num hospital terciário. Assim, uma avaliação álgica mais precisa permitirá ao cirurgião indicar o melhor procedimento disponível para cada paciente, visando, a cima de tudo, uma recuperação mais digna e humana. O presente estudo visa quantificar a dor no pós-operatório imediato (24 horas após a realização do procedimento) e comparar sua intensidade nos pacientes que tiveram sua cirurgia realizada de modo convencional (Lichtenstein) e os que foram reparados com videolaparoscopia (TAPP).



Materiais e método

Foram avaliados, prospectivamente, 62 pacientes submetidos ao reparo cirúrgico de hérnia inguinal em dois hospitais do Complexo Hospitalar Ulbra (Hospital Luterano e Hospital Universitário Canoas) entre os meses de agosto de 2007 e janeiro de 2008. Todos os pacientes foram avaliados mediante o uso de um protocolo previamente desenvolvido no dia da realização do procedimento. Após 24 horas eram reavaliados, utilizando-se uma Escala Análogo Visual (apêndice A) em que o pacientes quantificava a intensidade de sua dor. A analgesia no pós-operatório foi feita para todos com dipirona 500 mg endovenoso de 6/6 horas, cetoprofeno 100 mg endovenoso 12/12 horas e caso houvesse dor forte, morfina 3 mg endovenoso de 4/4 horas. Os critérios de exclusão deste estudo eram pacientes com idade menor de 18 anos, portadores de dor crônica e àqueles que eram classificados como classe III, de acordo com a American Society of Anesthesiologist.

Os pacientes foram divididos em dois grupos e foram pareados em relação à faixa etária, sexo e índice de massa corporal. Devido à impossibilidade de pareamento, 22 pacientes foram excluídos deste estudo. No grupo I, composto 20 pacientes, realizou a correção por meio do vídeo (TAPP) e o grupo II, também composto de 20 integrantes, realizou-se a hernioplastia pelo método convencional através da utilização da técnica de Lichtenstein.

Trata-se de um estudo caso-controle em que o tipo de cirurgia é o fator em estudo e a intensidade da dor 24 horas após a realização do procedimento é o desfecho. No entanto, outras características de ambos os grupos foram avaliados como posicionamento das hérnias (direita X esquerda X bilateral), tipo (direta X indireta X mista), complicações, primárias ou recidivadas.

Por tratar-se de um estudo não intervencionista e que não identifica os pacientes, este trabalho não apresenta nenhum risco à população estudada. O projeto foi submetido à avaliação do Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Luterana do Brasil, sendo aprovado pelo mesmo.

Para análise da casuística e dos resultados foi utilizado o teste T de Student. O nível de significância foi de 5% (p = 0,05).

Resultados

Numa tentativa de tornar ambos os grupos, grupo I da videolaparoscopia e grupo II da cirurgia aberta, o mais homogêneo possível, realizaram-se o pareamento quanto ao sexo, à faixa etária e ao índice de massa corporal. A Tabela 1 mostra as características da amostra estudada.

A Tabela 2 mostra que, embora a média da intensidade da dor 24 horas após a realização do procedimento tenha sido maior no grupo I, de acordo com o teste T de Student, considerando o nível de significância de 5%, não houve diferença significativa (p>0,05) entre os dois grupos estudados.



* Videolaparoscopia.

A Tabela 3 mostra as características de ambos os grupos e suas principais diferenças.

Em relação ao posicionamento das hérnias, 50% (n=10) eram unilaterais no grupo I, enquanto que no grupo II 90% (n=18) eram unilaterais. Dessa forma, realizou-se uma nova comparação entre os dois grupos, utilizando-se somente pacientes com hérnias unilaterais como mostra a Tabela 4.

A média de dor do grupo “VLP” foi 4,1 e no grupo “convencional” foi de 4,1 (p=0,95). Assim como a análise anterior, este resultado não detectou diferença estatisticamente significativa para a média de “dor” entre os grupos da variável “cirurgia”.

Seguindo no grupo da videolaparoscopia, realizou-se a comparação na intensidade de dor entre os pacientes que tinham hérnias bilaterais e aqueles que tinham somente em um lado, como mostra a Tabela 5.

Entre os pacientes submetidos ao procedimento endoscópico a média de dor do grupo unilateral foi de 4,1, enquanto a média do grupo bilateral foi de 4 (p=0,87).

Discussão

A dor no pós-operatório causa um impacto relevante nos pacientes que são abordados cirurgicamente e seu controle é fundamental para amenizar o sofrimento e possibilitar uma recuperação mais rápida e eficaz(6). O propósito deste estudo foi comparar a intensidade da dor 24 horas após a realização da herniorrafia por Lichtenstein e TAPP.

Sendo o Complexo Hospitalar ULBRA um serviço de saúde de referência, as herniorrafias pela técnica de Lichtenstein foram realizadas por médicos residentes do Serviço de Cirurgia Geral, enquanto que os pacientes submetidos à VLP foram operados por médicos residentes do Serviço de Cirurgia Digestiva.




No presente estudo não há diferença de dor causada pelo procedimento convencional ou videolaparoscópico após 24 horas da realização da cirurgia. Deve-se ressaltar que são necessários mais estudos com um número maior de pacientes para que estes achados possam ser extrapolados para a população em geral, pois, apesar do pareamento realizado, o pequeno número de indivíduos arrolados para este trabalho não permite conclusões definitivas sobre o tema.

Em nosso meio existe uma carência de estudos que documentem a avaliação de dor no pós-operatório imediato de hérnias inguinais, principalmente estudos comparativos entre técnicas cirúrgicas. De acordo com um estudo realizado na Turquia, Anadol AZ et al.(7), a intensidade de dor 24 horas após a realização do procedimento foi maior nos pacientes que foram submetidos à técnica de Lichtenstein, reforçando que procedimentos endoscópicos causam menos dor(8-9).

Neste estudo nenhum dos pacientes do grupo I ou do grupo II recebeu morfina, sendo utilizada apenas a analgesia padrão com dipirona e cetoprofeno. Baseando-se nos escores de dor adquiridos através da utilização da Escala Análogo Visual não houve diferença entre os dois grupos estudados, embora o grupo da VLP tivesse mais pacientes com hérnias bilaterais. Para evitar este fator de confusão, realizou-se uma comparação entre os dois grupos, utilizando-se somente pacientes com hérnias unilaterais. Da mesma forma que na análise anterior, não houve diferença na intensidade da dor. Numa última análise, comparou-se a dor entre os pacientes que tinham hérnias unilaterais com os pacientes que tinham hérnias bilaterais dentro do grupo do procedimento endoscópico. Os resultados mostraram que também não houve diferença estatisticamente significativa, o que sugere que num procedimento endoscópico a colocação de tela bilateralmente não acrescenta mais dor no pós-operatório em relação à colocação de tela em apenas um lado.

No grupo I, técnica de Lichtenstein, a média de dor foi de 3,90, enquanto que no grupo II, da VLP, a média foi de 4,11. Mesmo o grupo II apresentando uma média de dor maior, p-valor foi superior a 0,05, considerando o nível de significância de 5%, demonstra que do ponto de vista estatístico os grupos não são diferentes.




Bibliografia
1. McCarthy M Jr., Chang C-H, Pickard A, et al. Visual analog scales for assessing surgical pain. J Am Coll Surg 2005 201: 245-252.
2. Myles PS, Troedel S, Boquest M, Reeves M. The pain visual analog scales: it linear or nonlinear? Anesth Analog 1999 89: 1517-1520.
3. Bodian CA, Freedman G, Hossain S, et al. The visual analog scale for pain:clinical significance in postoperative patients. Anesthesiology 2001 95: 1356-1361.
4. Ohnhaus EE, Adker R. Methodological problems in the measurement of pain: a comparison between the verbal rating scale and the visual analog scale. Pain 1975 1:379-384.
5. Kehlet H et al. Postoperative opioid analgesia: time for a reconsideration. J Clin Anesth 1996 8:441-445.
6. Serrano SC, Júnior JO. Noções básicas sobre analgesia no paciente cirúrgico. Revista clínica e terapêutica. 2006 abril v 32.
7. Anadol AZ, Ersoy E, Taneri F, Tekin E. Outcome and Cost Comparison of Laparoscopic Transabdominal Preperitoneal Hernia Repair versus Op Lichtenstein Technique. J Lap Adv Surg Tech. 2004 14, p 159-163.
8. Chung RS, Rowland DY. Meta-analyses of randomized controlled trials of laparoscopic vs conventional inguinal hernia repairs. Surg Endosc 1999 13: 689-694.
9. Amid PK, Shulman AG, Lichtenstein IL. An analytic comparison of laparoscopic hernia repair with open “tension free” hernioplasty. Int Surg 199580:9-17.