Numeração de páginas na revista impressa: 36 à 38
Introdução
O tromboembolismo venoso (TEV), incluindo a trombose venosa profunda (TVP) e o tromboembolismo pulmonar (TEP) são complicações comuns de procedimentos cirúrgicos, notadamente os oncológicos, e de longa duração. O risco de TEV em pacientes cirúrgicos é determinado pela combinação de fatores predisponentes individuais e o tipo de cirurgia pretendida (Figura 1). Os principais fatores de risco enumerados na literatura são: DPOC, obesidade, ICC, insuficiência venosa periférica, doença neoplásica, imobilização por longo prazo, gestação e reposição hormonal.
A TVP pode ser considerada uma das doenças mais negligenciadas da prática clínica atual. Seu diagnóstico é obtido através da estratificação de risco, suspeição clínica e utilização de exames complementares (ultra-sonografia doppler ou flebografia). Classicamente, manifesta-se através de dor e edema em membros inferiores. Tais sintomas são subjetivos, de difícil avaliação e confirmação, de maneira que inúmeros casos não são diagnosticados. A maioria dos pacientes acometidos por TVP apresenta uma evolução subclínica. Ao mesmo tempo, a terapêutica a ser empregada não é isenta de risco, apresentando, quando mal-indicada, complicações tão graves quanto a doença de base. Infelizmente, a maior parte dos casos é diagnosticada após a manifestação de tromboembolismo pulmonar (TEP).
Os pacientes cirúrgicos não apresentam fatores de risco mais elevados para TVP e TEP, quando comparados aos internados por razões eminentemente clínicas. De maneira geral, pacientes cirúrgicos são submetidos à profilaxia adequada mais freqüentemente. Tal taxa de prevenção é ainda considerada abaixo da desejável, oscilando em 60% dos casos indicados.
As cirurgias urológicas, de maneira geral, são consideradas de risco elevado para eventos tromboembólicos. Inúmeros fatores colaboram para tal estigma, incluindo associação freqüente com neoplasia, longos períodos do paciente em posição de litotomia, insuficiência renal concomitante e manipulação da região pélvica.
Profilaxia
Na prevenção da trombose venosa profunda e do embolismo pulmonar existe uma ampla variedade de procedimentos que podem ser utilizados. São classificados como mecânicos (meia elástica, deambulação precoce, compressão pneumática intermitente, fisioterapia motora) ou farmacológicos (heparina não fracionada, heparina de baixo peso molecular, anticoagulante oral). A compressão pneumática intermitente pode ser instalada no pré-operatório e mantida por 48 a 72 horas após a intervenção.
A profilaxia com métodos mecânicos e farmacológicos é segura e efetiva na maioria das cirurgias e deve ser implementada rotineiramente (Figura 1). Para cirurgias urológicas de baixo risco a única medida adotada é a deambulação precoce no pós-operatório. Com relação a procedimentos laparoscópicos, apesar da diminuição do retorno venoso, não há evidências do aumento do risco de TEV quando comparados a procedimentos convencionais. Porém, no que diz respeito a procedimentos laparoscópicos do retroperitônio superior (rins/adrenais/ureteres), ao menos um estudo recente comprova aumento da incidência de complicações hemorrágicas quando da utilização de heparina de baixo peso molecular. Neste grupo específico de pacientes, a utilização de compressão pneumática intermitente apresenta taxas equivalentes de profilaxia de TEV, sem as referidas complicações hemorrágicas.
Figura 1 – Prevenção da trombose venosa profunda (doentes cirúrgicos). Fonte: Grupo de Elaboração de Diretrizes em Trombose Venosa Profunda da Sociedade Brasileira de Angiologia e Cirurgia Vascular.
Tratamento
O tratamento da TVP no ambiente hospitalar (Figura 2) envolve anticoagulação plena, inicialmente através da utilização da heparina não fracionada ou de baixo peso molecular. Associa-se anticoagulante oral (antivitamina K) com o tratamento estendendo-se por três a seis meses. Procura-se manter o RNI na faixa 2-3 durante o período, objetivando diminuir os riscos de fenômenos tromboembólicos associados, notadamente tromboembolismo pulmonar.
Conclusão
Os fenômenos tromboembólicos constituem desafio na prática cirúrgica diária. Seu diagnóstico é complexo, muitas vezes demandando a avaliação do especialista. Contribuem decisivamente no aumento da morbidade e mortalidade perioperatórias. Deve-se avaliar adequadamente os fatores de risco inerentes a cada caso, procurando-se estabelecer profilaxia adequada.
As cirurgias urológicas são consideradas de risco para o desenvolvimento de trombose venosa profunda, devendo o urologista estabelecer medidas profiláticas de rotina. No caso específico de procedimentos videolaparoscópicos do retroperitônio superior é recomendada a utilização de profilaxia mecânica, devido ao maior risco de eventos hemorrágicos associados ao uso da heparina.
Figura 2 – Tratamento hospitalar da trombose venosa profunda. Fonte: Grupo de Elaboração de Diretrizes em Trombose Venosa Profunda da Sociedade Brasileira de Angiologia e Cirurgia Vascular.
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