Revistas Fase R003 Id Materia 3203






Revisão
Frente de ondas (wavefront) e limites da visão humana
Mirko Jankov, MD
Augenklinik, UniversitätsSpital Zürich, Suíça. Departamento de Oftalmologia da Santa Casa de São Paulo – Brasil.
Michael Mrochen, PhD
Augenklinik, UniversitätsSpital Zürich, Suíça. ETH, Zürich, Suíça.
Theo Seiler, MD, PhD
Augenklinik, UniversitätsSpital Zürich, Suíça.
Endereço para correspondência: Mirko Jankov – R. Novo México, 6 – Granja Viana – Cotia – SP – Brasil – CEP 06700-000 – E-mail: mirkojankov @hotmail.com

Numeração de páginas na revista impressa: 18 à 24

Parte 1 – Fundamentos

O que é frente de ondas?


Luz é a forma de energia radiante, similar às ondas de rádio, calor radiante, raios ultravioletas e raios X, e é transmitida através do meio óptico a partir das fontes luminosas. Num meio óptico homogêneo a luz se propaga uniformemente a partir de um ponto luminoso e na mesma velocidade em todas as direções, assemelhando-se às ondas na superfície da água originadas a partir de uma pedra nela lançada. Sua posição em cada momento determinado é uma esfera formada, juntando todos os pontos em mesma fase e tem como seu centro a sua própria fonte. Tais superfícies esféricas imaginárias se chamam frentes de luz ou frentes de onda. Nas frentes de ondas todos os raios luminosos possuem a mesma fase e o mesmo comprimento de caminho óptico, onde comprimento de caminho óptico se refere ao produto entre comprimento geométrico e índice refracional do meio.

Quais são os limites de visão humana?

Há três fatores limitadores de detalhes mais finos para o olho humano: óptico, retínico e neural(1). Os fatores retínico e neural não serão discutidos aqui devido à complexidade do assunto, valendo lembrar que a limitação máxima de acuidade visual imposta por esses dois fatores é de aproximadamente um minuto de arco ou aproximadamente 2.0 (20/10) pela tabela de Snellen tradicional.

Em relação ao limite óptico há quatro fontes de embaçamento de imagem: dispersão, difração, aberração cromática e aberração monocromática. Dispersão será desprezada nesta ocasião, tendo em vista que ela é pouco relevante em olhos sãos de indivíduos jovens. Difração por outra parte é extremamente dependente do diâmetro da pupila. As únicas causas importantes de embaçamento visual em pupilas maiores dos olhos sadios e jovens são aberrações cromáticas e monocromáticas.

A luz de cada comprimento de onda (visualizada em cores diferentes) possui índice refracional levemente diferente e por isso uma cor é refratada diferentemente quando comparada com outra; esse fenômeno se chama aberração cromática. Luz com comprimento de onda mais curto (por exemplo, verde) terá seu foco mais perto de córnea e cristalino comparado com a luz com comprimento de onda mais longo (por exemplo, vermelho), mas somente uma única imagem poderá estar em foco num determinado momento. A diferença cromática total no espectro visual inteiro é de quase duas dioptrias e, sendo assim, têm efeitos importantes na degradação da qualidade de imagem retínica e, conseqüentemente, na acuidade visual.

Imaginem agora um grupo de raios de luz paralelos incidindo numa lente ideal, onde todos os pontos na mesma fase, a frente de ondas, são verticais à propagação dos raios e formam um plano perfeito. Essa lente ideal transformará a frente de ondas plana em frente esférica; conseqüentemente, todas as frentes de ondas serão esferas concêntricas cujo centro ficará no ponto focal da lente. Ora, qualquer lente real (não ideal) modificará essas frentes de ondas ideais de maneira que raios diferentes não coincidirão mais num ponto focal único e esse fenômeno se denomina aberração monocromática.

Coeficientes de Zernike

Frits Zernike (1888-1966), matemático holandês e ganhador do Prêmio Nobel em 1953, desenvolveu na década de 40, do século XX, um sistema matemático para descrever aberrações ópticas – polinômios de Zernike. Esses polinômios bastante complexos, hoje em dia já bem estabelecidos na óptica técnica e fisiológica, são um jeito eficiente de representar as aberrações de frente de ondas no olho humano também. Cada polinômio representando uma aberração isolada típica, permite definir “desfoco” (‘esfera’ do jargão óptico) e astigmatismo (‘cilindro’), bem como outras aberrações de alta ordem (Figura 1).

As aberrações ópticas se tornam mais complexas com ordem (nível) do polinômio e são também dependentes de diâmetro de pupila. Mesmo para escrever a forma simples de aberração esférica é preciso o polinômio de 4a ordem, i.e. essa é função dependente de quarta potência de raio de pupila – r4. Tendo em vista a correlação extremamente forte entre as aberrações ópticas e tamanho de pupila, as medidas de aberrações têm sentido somente nas pupilas maiores de 5 mm.


Figura 1 – Representação gráfica dos primeiros 15 polinômios Zernike (até 4a ordem).

Qual é significado prático de polinômios de Zernike?

Para explicar isso usaremos um exemplo de uma outra área de física. Lembram-se dos tempos dos primeiros sintetizadores de som (órgãos), daqueles teclados capazes de imitar todos aqueles instrumentos musicais? Eles produziam eletronicamente os sons ‘puros’ com freqüência de base e acrescentavam alguns harmônicos com outras freqüências para maquiá-los e construir o ‘timbre’ que os façam soar o mais ‘natural’. Mesmo quando no teclado escolhíamos piano ou violino, por exemplo, era bastante óbvio o quanto ainda o som era artificial, porém havia alguma semelhança grosseira com os sons dos instrumentos verdadeiros. As gerações mais novas dos órgãos já produzem sons bem mais verídicos, enriquecendo os sons com vários harmônicos de intensidades e alturas diferentes. Se isso já era bom, hoje em dia a tecnologia de som artificial facilmente engana o ouvido humano que não consegue distinguir sons produzidos por sintetizadores de sons no órgão ou no reprodutor de cd do som ‘real’. Isso significa que qualquer som natural pode ser decomposto em componentes de som (som de base e seus harmônicos) e também pode, dependendo do seu número e precisão, representar matematicamente o som natural por si.

Voltando para a aberração do olho humano, uma representação matemática semelhante pode ser feita usando-se polinômios de Zernike; as aberrações podem ser representadas pelas suas subcomponentes (aberrações de diferente ordem de Zernike, correspondendo aos diversos harmônicos no exemplo anterior) e sua fidelidade depende unicamente do número e precisão de seus componentes. Aberração total (correspondendo ao som ‘real’) é representada pela soma de todos os seus componentes.

Na Figura 1 se encontram simulações computadorizadas de todas as aberrações até 4a ordem de Zernike. Dentre as aberrações de baixa ordem de Zernike (até 2a ordem) as mais bem conhecidas e amplamente utilizadas para prescrição de lentes corretivas são C4 (desfoco) e combinação de C3 e C5 (astigmatismo). Esses três coeficientes da 2a ordem representam quase a totalidade de aberrações num olho com erro refracional existente(2), e essa é a razão pela qual a correção com as lentes clássicas esfero-cilíndricas é tão efetiva, mesmo não sendo perfeita.

Aberrações de alta ordem representam aproximadamente 20% das aberrações num olho com baixo erro refracional e são significativamente aumentadas após os tratamentos cirúrgicos refracionais tradicionais(3). Coma de 3a ordem, ou aberração em forma de cometa, e aberração esférica de 4a ordem, onde os raios periféricos são refratados mais que os paracentrais, são as aberrações de alta ordem mais freqüentes.


Figura 2 – Dados obtidos pela topografia corneal e frente de ondas.

Medida das aberrações ópticas

Aberrações ópticas de alta ordem foram consideradas parte das propriedades ópticas do olho humano ainda no século XIX e a partir daí o olho foi considerado um sistema óptico de má qualidade. Tscherning estabeleceu no final de século XIX um método para se medir aberrações do olho humano e construiu um aberrômetro simples para tal finalidade(4), e somente na segunda parte do século XX o mesmo tópico foi novamente abordado e resolvido por um outro método, envolvendo o cilindro cruzado por Howland & Howland(5). No início dos anos 90 do século XX, Liang e col.(6) otimizaram o sensor Hartmann-Shack, usado em astronomia até então, para análise de frentes de onda do olho humano, enquanto na mesma época Mierdel e col.(7) atualizaram e modernizaram o aberrômetro original de Tscherning.

Topografia corneal computadorizada de alguns topógrafos, munidos do software adequado, também é capaz de descrever a frente de ondas definido pelas irregularidades fisiológicas e não fisiológicas de córnea. Em geral, o fato que realmente diferencia os dados obtidos pela topografia corneal computadorizada em comparação aos do aberrômetro é que enquanto a topografia descreve a frente de onda oriunda da superfície ocular, o aberrômetro nos dá informação sobre o desempenho total de todos os elementos ópticos do olho em conjunto i.e. córnea, câmara anterior, cristalino e corpo vítreo (Figura 2).

Em conclusão, a tecnologia de frente de ondas oferece uma nova maneira de quantificar e classificar os erros de imagem óptica do olho humano. Muitos ensaios clínicos com esta técnica estão sendo efetuados em vários centros de pesquisa nos Estados Unidos e Suíça que nos darão a relevância clínica e terapêutica de modificação cirúrgica de erros de frente de ondas. O próximo artigo abordará esses aspectos, ressaltando as peculiaridades da análise de frente de ondas, bem como algumas aplicações clínicas e cirúrgicas no dia-a-dia da prática oftalmológica.


Parte 2 – Aplicações

Quais fatores influenciam a frente de ondas?


Como o papel de aberrações cromáticas, monocromáticas e tamanho de pupila já foram discutidos previamente (Parte 1 – Fundamentos), abordaremos alguns outros fatores que influenciam a frente de ondas.

Qualquer tentativa de melhorar a qualidade óptica de olho humano seria limitada ou até sem sentido, se a reprodutibilidade das medidas das aberrações de alta ordem fosse baixa. Enquanto a média tem valor entre 0,1 e 1,0 µm, dependendo da ordem de Zernike em questão, a variabilidade diurna é somente entre 0,01 e 0,06 µm. Esse valor expresso em RMS método (Root Mean Square – correspondente ao desvio padrão da estatística comum) e é aproximadamente nove vezes menor comparado à magnitude média das aberrações da segunda ordem (esfero-cilíndro tradicional) e três vezes menor do que as aberrações da terceira e quarta ordem (coma e aberração esférica). Retirando os erros de medida, como tamanho de pupila, posição ou alinhamento diferente entre as medidas, as aberrações ópticas no olho humano mostram uma estabilidade de vários meses(1) com uma reprodutibilidade estatística das aberrações de alta ordem de menos que 0,01 µm para a pupila de 8 mm(2).

Uma certa instabilidade temporal das aberrações de alta ordem, porém, foi descrita predominantemente em função da acomodação com seus ajustes de microflutuação(3). Este fato levanta uma nova pergunta: a correção de todas as aberrações para visão de longe será benéfica para visão de perto também? Acredita-se hoje em dia que o perfil de ablação individual personalizada para corrigir perfeitamente todas as aberrações de alta ordem em um certo estado acomodativo terá pouco ou nenhum sucesso quando o estado acomodativo estiver substancialmente alterado. Em outras palavras, em algumas situações a eventual correção cirúrgica individualizada de aberrações de alta ordem pode ser melhor que a correção tradicional esfero-cilíndrica, enquanto em outras pode ser pior. Este problema está sendo investigado para melhor entendimento e possível solução em próximo futuro.

Em adição aos fatores neuronais que se deterioram com a idade, ressalta-se que a degradação significativa da qualidade de imagem retínica provê mais das alterações das propriedades físicas dos meios ópticos no processo de envelhecimento, especialmente dispersão no cristalino e na córnea, do que das aberrações de alta ordem, como coma ou aberração esférica que aumentam em menor escala(4).

O filme lacrimal, já apontado como responsável para obtenção de imagem boa e confiável de videoceratografia corneal computadorizada, ganha de novo o papel primordial na qualidade e confiabilidade de medida de frente de ondas. Investigações sobre influência de colírios de lágrimas artificiais nas medidas das aberrações ópticas, bem como sobre condições de superfície ocular sub- ou anormal, estão sendo realizadas e serão apresentadas em breve para a comunidade oftalmológica.

Perfil de ablação personalizado e benefício visual

Há dois princípios básicos pelos quais é possível modificar e diminuir aberrações ópticas. Primeiro, alterando-se o índice refrativo de alguns pontos específicos entre os elementos ópticos do olho, os comprimentos de trajetórias ópticas podem ser re-igualados e assim a frente de ondas regularizada. Infelizmente, no nível de desenvolvimento tecnológico atual isso não é alcançável. Outra possibilidade é modificando o comprimento de trajetória geométrica de alguns raios, o que é perfeitamente possível usando-se processo de foto-ablação por meio de excimer laser.

Baseando-se nesse último princípio os dados de frente de ondas servem como a base de cálculo do perfil de ablação personalizada para o procedimento cirúrgico refrativo por meio de excimer laser. Para definir-se o perfil de ablação é preciso decompor as informações sobre a frente de ondas individualizada em uma seqüência detalhada de tiros de laser a serem executados na superfície de córnea. Algoritmos de um software especial são utilizados para definir a posição exata de cada um dos tiros e posição desejada na córnea com uma precisão micrométrica.
Benefício visual real de correção das aberrações de alta ordem depende de dois parâmetros: da importância relativa pela qual elas realmente diminuem a qualidade de visão do indivíduo específico e da precisão com que as aberrações possam ser corrigidas. Tal benefício representa uma estimativa de quanto o contraste da imagem retínica (e conseqüentemente a qualidade de visão) incrementaria se todas as aberrações monocromáticas e não somente da 2a ordem de Zernike (esfero-cilíndricas) fossem corrigidas.

Corrigindo somente as aberrações cromáticas, o benefício esperado é relativamente pequeno dado o embaçamento da imagem pelas aberrações monocromáticas não corrigidas. Seguindo o mesmo princípio, as aberrações cromáticas diminuiriam o resultado da correção exclusiva de aberrações monocromáticas, apesar de que este efeito é considerado aceitável e o excimer laser hoje em dia atua exatamente na correção das aberrações monocromáticas, não levando em consideração o residual de aberração cromática. Ora, eliminando os dois tipos de aberrações, o contraste visual seria elevado até 12 vezes(5) o que, infelizmente, não é possível no nível tecnológico atual.

Deve ser ressaltado aqui também que a ordem de Zernike que pode ser calculada, e assim corrigida no olho, depende basicamente de dois elementos: tamanho do ponto de laser (diâmetro do tiro do raio laser) e a precisão pela qual o tiro pode ser aplicado na córnea (dependendo do eye tracker). Teoricamente, com um ponto de laser do tamanho de 2 mm, nada mais do que as aberrações tradicionais esfero-cilíndricas (2a ordem de Zernike) podem ser corrigidas. Diminuindo o ponto até 0,6-0,8 mm já as aberrações de até 8a ordem de Zernike se tornam alcançáveis.

Descentralização do tratamento pelo excimer laser reduz o benefício de correções de aberrações de todas as ordens(6), mesmo nas descentrações subclínicas (menores do que 1 mm). As aberrações mais comumente alteradas são o simples “Tilt” (1a ordem), além das aberrações de alta ordem como o “Coma” (3a ordem) e o “Astigmatismo” de 4a ordem. Sem o auxílio de “eye tracker” não é possível corrigir as aberrações de alta ordem por conta de descentralização e conseqüente efeito de ‘embaçamento’ (smearing)(7).

A Figura 3 mostra a qualidade de visão (VA) em função de aberrações de frente de ondas (WA). Pode ser notado que os dois parâmetros são indiretamente proporcionais: a degradação de qualidade visual observada nas imagens da esquerda para a direita é causada pelo aumento de aberrações. É importante ressaltar que mesmo com aumento de aberrações a percepção de detalhes até um certo grau ainda persiste, apontando assim uma diferença importante entre acuidade visual clinicamente avaliada e qualidade de visão real, o que às vezes proporciona a insatisfação do paciente após da cirurgia refrativa mesmo com acuidade visual ‘normal’. Analisando-se a Figura 3, deve-se admitir que a presença de linhas verticais é notada até a terceira imagem, porém a qualidade dessa percepção é discutível, enquanto já a definição de detalhes na última imagem se torna impossível.

Em conclusão, o benefício importante de qualidade de visão pode ser alcançado corrigindo-se as aberrações monocromáticas de alta ordem, especialmente para a população jovem e sadia em que essas são as causas limitadoras mais importantes de acuidade visual. É esperada melhoria significativa especialmente nas situações com pouca luz, como, por exemplo, condução noturna de carro, onde o tamanho de pupila aumentada torna as aberrações ópticas fator muito importante de degradação de qualidade de visão.


Figura 3 – Acuidade visual (VA) em função das aberrações ópticas (WA).

Aplicações clínicas promissores e perspectivas futuras

Desde junho de 1999, quando os primeiros pacientes foram submetidos ao LASIK guiado pela frente de ondas (wavefront-guided LASIK) em Dresden, Alemanha, por prof. Seiler(8), vários estudos ocorrem em múltiplos centros nos EUA e Europa com a finalidade de avaliar a eficácia e precisão desta nova técnica cirúrgica refrativa. Primeiros resultados pós-operatórios de três meses para 30 olhos tratados assim pelo mesmo grupo mostraram que a correção das aberrações ópticas é possível em aproximadamente 20% dos pacientes(9). Apesar deste resultado parecer modesto, é importante ressaltar que aberrações ópticas de alta ordem foram aumentadas discretamente, em média 1,4 vez, enquanto depois do procedimento LASIK regular o aumento é de aproximadamente 5 vezes.


Figura 4 – Tratamento da ablação descentralizada primária: a) topografia corneal antes (à esquerda) e depois (à direita) do tratamento guiado por frente de ondas. b) mapa de aberração de frente de onda antes (à esquerda) e depois (à direita) do tratamento guiado por frente de ondas.

O dilema para escolha de técnica mais adequada, PRK ou LASIK, ganha agora um outro aspecto interessante. Os primeiros resultados dos estudos comparativos mostram que um ano depois do procedimento cirúrgico todas as aberrações de alta ordem aumentam nos dois grupos, enquanto o aumento de aberração esférica (4a ordem) mostra-se significativamente maior depois do LASIK comparado com PRK(10). Este dado se encontra de acordo com observações dos trabalhos em andamento de outros grupos [McDonald M, comunicação pessoal], apesar de que mais resultados ainda são esperados para conclusões finais.

Tratamento guiado pela frente de ondas não é exclusivamente destinado aos tratamentos primários, mas também para ‘retoques’ nas ablações primárias irregulares, pequenas ou descentradas, bem como ilhas centrais ou irregularidades depois de transplante de córnea penetrante. Inicialmente para estes pacientes o tratamento de escolha foi fotoablação guiada pela topografia corneal(11), mas os resultados foram bastante modestos. Na Figura 4A estão expostas as topografias, enquanto na Figura 4B os mapas de aberrações ópticas antes e depois do tratamento guiado pela frente de ondas. Na topografia antes do tratamento (4A esquerdo) observa-se nitidamente descentração, que é representada pela irregularidade do mapa de aberrações (4B esquerda). Agora, topografia depois da cirurgia (4A direito) apresenta irregularidade e descentração diminuída, porém ainda presente, enquanto mapa de frente de ondas (4B direito) mostra-se muito regular e perfeitamente centralizado. Este fato mostra a importância de aberrações ópticas como uma irregularidade de frente de ondas resultante de todos os elementos ópticos e não é difícil imaginar qual seria o resultado neste paciente caso a topografia ‘perfeita’ tivesse sido considerada como meta final.

A tecnologia de frente de ondas, além de contribuir para melhorar a qualidade da visão por meio de cirurgia refrativa, tem possibilitado também, por meio de superfotos do fundo de olho, visualizar cones individuais (adaptive optics)(12). Que tal uma LIO nos pacientes de catarata passível das correções e ‘ajustes’ finos in situ das aberrações depois de ser implantada? Ou lentes de contato personalizadas não somente como tóricas para corrigir astigmatismo corneal detectável na topografia, mas corrigindo todas as aberrações ópticas para cada paciente individualmente?

A posição atual dos tratamentos guiados pela frente de ondas é de individualizar e personalizar medida e correção das aberrações ópticas. A meta principal é de não deixar a visão piorar depois do tratamento cirúrgico refrativo, como acontece hoje em dia com os tratamentos tradicionais. Em seguida, a meta se estenderá aos melhoramentos visuais e à optimização dos aparelhos de medida e cirúrgicos atuais. A aberroscopia se mostrou como um método sólido de avaliação das aberrações ópticas, inclusive das de alta ordem, e confiável o suficiente para o tratamento cirúrgico ser baseado nele. Porém, ainda há vários fatores conhecidos e desconhecidos influenciando ou podendo influenciar a medida e assim o resultado visual final, por exemplo alterações biomecânicas da córnea, irregularidades epiteliais, influência do filme lacrimal, fenômeno de dispersão, anormalidades de hidratação do estroma etc.

Em conclusão podemos dizer que o tratamento guiado pela frente de ondas está no caminho para a realidade clínica e cirúrgica do oftalmologista para a correção não somente de miopia, hipermetropia ou astigmatismo, mas também das aberrações de alta ordem, o que pode mudar a atitude tanto do médico quanto do paciente em relação à cirurgia refrativa. Hoje os pacientes querem se livrar dos óculos ou lentes de contato e esperam a qualidade de visão depois da cirurgia igual à anterior; mas quanto tempo vai demorar para os pacientes quererem visão melhor que normal, a ‘supervisão’?




Bibliografia
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