Avaliação das lesões não palpáveis |
Evaluation of breast lesion |
Juarez Antônio de Sousa |
Preceptor geral da Residência de Ginecologia e Obstetrícia do Hospital Materno Infantil de Goiânia. Coordenador do curso de Mastologia do Hospital Materno Infantil de Goiânia. Médico assistente do Setor de Mastologia da Universidade Federal de Goiânia – (UFG). |
Maurício Pinheiro Pompeu de Campos |
Residente de Ginecologia e Obstetrícia do Hospital Materno Infantil de Goiânia – GO. |
Marco Aurélio Albernaz |
Chefe da Residência de Ginecologia e Obstetrícia do Hospital Materno Infantil de Goiânia – GO. |
Unitermos: lesões mamárias, câncer de mama. |
Unterms: breast lesions, breast-cancer. |
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Introdução A glândula mamária é de fundamental importância para a feminilidade da mulher. No entanto, pode apresentar inúmeras alterações patológicas, despertando a atenção de muitos pesquisadores, principalmente no intuito de desvendar o mistério do câncer. A mama é um órgão superficial, facilmente palpável, sendo de se esperar que a maioria das alterações fossem diagnosticadas sem dificuldades. Porém, não raramente, deparamo-nos com lesões mamárias não palpáveis de difícil avaliação. O contínuo acréscimo da participação de mulheres em programas de rastreamento mamográfico tem resultado em aumento no número de lesões mamárias não palpáveis. Este efeito trouxe duas repercussões: 1. A detecção precoce do câncer de mama, que tratado adequadamente, oferece taxas de sobrevida comprovadamente superiores aos estágios mais avançados; 2. O grande contigente de achados mamográficos benignos, que requer do clínico uma conduta mais ou menos agressiva a depender do grau de suspeição da lesão. Israel (1996) observou que os programas de rastreamento mamográficos detectam cinco casos de câncer em mil mulheres examinadas. Nesta mesma amostra, observa-se 40 casos de lesões indeterminadas que requerem algum tipo de procedimento para elucidação diagnóstica. As lesões mamográficas clássicas não apresentam grandes dificuldades de manejo. A grande dúvida é exatamente o vultoso número de lesões provavelmente benignas, que devem ser cuidadosamente avaliadas por exames mamográficos e outros exames de imagem, pois a possibilidade de malignidade é menor que 2%. Para estas lesões, exames periódicos podem ser indicados a cada seis meses por dois a três anos, como alternativa à biópsia cirúrgica, diminuindo gastos hospitalares (Sickles, 1991; Brenner, 1991). Com o intuito de padronizar os tipos de lesões mamárias encontradas em exames mamográficos que não são evidenciáveis ao exame físico (lesão mamária não palpável), propusemo-nos a estudá-las, determinado suas características, morfologia e parâmetros para que se indique uma biópsia ou seguimento clínico. |
Sumário A utilização da mamografia em larga escala tem indentificado um grande número de lesões mamárias benignas não palpáveis. A prática indiscriminada de biópsias dessas lesões tem levado a um aumento do número de cirurgias desnecessárias. É apresentado um roteiro prático com o intuito de padronizar as lesões mamárias não palpáveis, determinado suas características, morfologia e parâmetros para a indicação de biópsia ou seguimento clínico. |
Sumary The use of mammography in large scale has been identified a great number of benign non palpable breast lesions. Indiscriminate biopsies of benign non palpable breast lesions have been increased the number of unnecessary surgeries. A practical guide is presented with the intention of standardizing the non palpable breast lesions, identifying their characteristics, morphology and parameters for the biopsy indication or clinical following. |
CLASSIFICAÇÃO 1. Achados mamográficos indicativos de lesões claramente benignas, para as quais não se recomendam exames periódicos de rastreamento: – Calcificações cutâneas (mesmo que agrupadas), geralmente centro-luscentes ou esféricas sólidas que ocorrem nas glândulas sebáceas; – Calcificações características de fibroadenomas, na maioria das vezes arredondadas, esféricas, centro-luscentes, às vezes grosseiras ou com aspecto de “pipoca”, sugerindo fibroadenomas em involução; – Calcificações arteriais; – Calcificações de parede de cistos, finas em “casca de ovo ou anel”; – Calcificações por fios de suturas devido ao depósito de cálcio no material. – Calcificações intraductais ou periductais devido à ectasia ductal. Geralmente são lineares e grandes; – Massas discretas contendo gordura no interior, deixando o centro da lesão translúcido; – Linfonodos intramamários, geralmente pequenos, medindo 0,5 a 1,0 cm. Para estas lesões, não se recomendam exames periódicos de rastreamento. Orienta-se controle clínico normal a cada seis meses e mamografia conforme a faixa etária. 2. Achados mamográficos interpretados como provavelmente benignos com recomendação de acompanhamento mamográfico periódico. Podem ser localizadas ou generalizadas. A. Lesões localizadas – caracterizadas como distribuição focal ocorrendo em um segmento de uma mama: – Calcificações finas agrupadas em um total de cinco ou mais por centímetro cúbico, desde que, à análise detalhada, demonstrem ser arredondadas ou ovaladas; – Nódulos sólidos não calcificados, de contornos arredondados, ovóides ou lobulados, bem definidos e não obscurecidos pelo tecido fibroglandular adjacente; – Áreas assimétricas focais de tecido fibroglandular denso facilmente visível nas duas incidências mamográficas; – Vários achados focais, incluindo um único ducto dilatado (especialmente se não estiver associado a fluxo mamilar espontâneo) e áreas de distorção arquitetural que não apresentam alta densidade central (p. ex.: cicatrizes de biópsias). B. Lesões generalizadas: múltiplas (três ou mais), similares entre si, distribuídas aleatoriamente por ambas as mamas, sendo calcificações ou nódulos, interpretados como provavelmente benignos, semelhantes às lesões focais acima descritas. Sickles, 1991, examinando 3.184 lesões mamográficas interpretadas como benignas e acompanhadas periodicamente, encontrou 58,2% de microcalcificações agrupadas; 26,4% nódulos bem definidos e 14,1% assimetria focal. Monostori, 1991, estudando a histologia de achados benignos, encontrou em 236 biópsias: 36% de alteração fibrocística, 25% fibroadenoma, 12% fibrose, 8% adenose esclerosante, 4% papilomatose, como sendo os diagnósticos mais frequentes. O exame mamográfico deve ser complementado com ultra-sonografia para diferenciar nódulos sólidos de cistos. Recomenda-se exame clínico semestral. A primeira mamografia de controle deve ser realizada seis meses após o último exame radiológico e, se não houver alteração no padrão radiográfico, orienta-se exame clínico semestral e mamografia anual. Caso ocorra alteração neste intervalo, indica-se biópsia. 3. Achados mamográficos interpretados como provavelmente malignos com recomendação de biópsia: – Massas (densidades) de bordos espiculados e limites irregulares; – Agrupamento de microcalcificações (acima de cinco por centímetro cúbico), pleomórficas ou heterogêneas, irregulares, variando na forma, tamanho e geralmente menores que 0,5 mm; – Microalcificações finas ou em galhos lineares; – Microcalcificações associadas a áreas sólidas irregulares; – Alteração no padrão da lesão na mamografia de seguimento, com aumento do nódulo, aparecimento de novas lesões e mudança na morfologia das microcalcificações. Monostori, 1991, avaliando a histologia de lesões malignas não palpáveis encontrou: 36% de carcinoma ductal in situ, 34% carcinoma ductal in situ associado a carcinoma ductal invasivo, 12% carcinoma ductal invasivo, 10% carcinoma lobular in situ, 6% carcinoma tubular e 2% carcinoma medular. Quando em exame mamográfico de rastreamento ou controle clínico nos deparamos com alguma destas lesões suspeitas, está indicada a elucidação cito/histológica. Esta poderá ser realizada através de uma simples punção aspirativa por agulha fina (PAAF), dirigida por ultra-sonografia ou podemos lançar mão de procedimentos mais sofisticados como a biópsia por agulha grossa, dirigida por ultra-sonografia (se a lesão for nodular), ou biópsia dirigida por estereotaxia (em tratando-se de microcalcificações) e exérese cirúrgica orientada por agulhamento ou mamotomia. DISCUSSÃO O câncer de mama é um problema de magnitude universal, com grandes repercussões em todo planeta, alcançando, a cada dia, maior interesse de pesquisadores no sentido de nortear seu impacto populacional, uma vez que sua incidência cresce de modo importante, principalmente em mulheres mais jovens. Com o objetivo de se detectar precocemente a doença, houve um aumento no número de exames mamográficos de rastreamento e, consequentemente, o número de lesões não palpáveis se elevou consideravelmente. Inicialmente, começaram-se a operar todas as pacientes com alterações mamográficas. Contudo, com o passar dos anos, a experiência foi mostrando-nos que a maioria destas lesões se tratavam de processos benignos e que os custos operacionais e repercussões psicológicas para as pacientes eram relevantes, levando-nos a selecionar melhor os casos a serem submetidos à cirurgia. Diante de uma lesão mamográfica devemos caracterizá-la conforme o grau de suspeição. Se o aspecto for provavelmente benigno, com achados de calcificações cutâneas, vasculares, grosseiras (sugestivas de pequenos fibroadenomas impalpáveis) e linfonodos intramamários, não há necessidade de acompanhamento com exame mamográfico periódico. Recomenda-se apenas que a paciente visite rotineiramente seu especialista a cada seis meses. Para as lesões mamográficas provavelmente benignas que merecem acompanhamento, como os nódulos bem delimitados não palpáveis menores que 2 cm, recomenda-se complementação ultra-sonográfica para diferenciar nódulo sólido ou cístico. Se cístico, dá-se por encerrado o caso e recomenda-se apenas controle clínico. Se a lesão for sólida, nova mamografia com intervalo de seis meses deve ser feita, e se não houver alteração do padrão radiológico, orienta-se controle clínico semestral e mamografia anual. Se o nódulo for maior que 2 cm, recomenda-se exérese. As áreas de densidade assimétricas e microcalcificações com aspecto benigno devem ser melhor avaliadas com compressão seletiva e magnificação e, persistindo o aspecto benigno, orienta-se um primeiro controle mamográfico com seis meses e a seguir anual. Os achados suspeitos de malignidade, como, por exemplo, as áreas de densidade assimétrica ou irregulares e espiculadas; as microcalcificações pleomórficas devem ser estudadas por compressão localizada e magnificação. Caso persista o padrão radiológico, deve-se realizar a biópsia. Podemos concluir que o estudo das lesões mamárias não palpáveis deve ser minucioso, no sentido de se discernir em que situações deve ser feito o acompanhamento periódico ou procedimento cirúrgico. |
Bibliografia |
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